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Jan Patocka. L’écrivain et son "objet"
Patocka – Antígona, não autonomia do sentido e do mundo humanos
quinta-feira 3 de julho de 2025
Antígona é, portanto, uma confirmação mítica da não autonomia essencial do sentido e do mundo humanos. A atestação da dependência do homem, de sua finitude fundamental, de sua crise e de seu errar na questão do bem e do mal, faz parte da essência do mito autêntico. O mito tal como o homem moderno o compreende é, por outro lado, um mito essencialmente falseado. O pensamento racionalista tem razão em se insurgir contra o mito na medida em que toma essa falsificação como alvo de seus ataques. O mecanismo é o seguinte: como a razão é um instrumento delicado, precário, complexo, que só pode se dirigir ao indivíduo (e, portanto, só produz resultados relativamente medíocres), é preciso, para governar o homem, mobilizar as forças "irracionais" que se enraízam em seu âmago "biológico" e "físico", submetendo-as a uma "representação" carregada de forte emoção. Essa representação se torna então um "mito" cujo valor pode ser determinado segundo uma pluralidade de perspectivas: pragmática, moral e lógica. No fundo, trata-se sempre de um artifício eficaz e atraente apesar de sua falsidade, um meio de multiplicar as forças e estender o poder do homem. Nesse sentido moderno, o mito está integralmente ancorado no mundo humano: na objetividade do homem como conjunto de instintos que certas representações solicitam e sobre os quais agem de modo a mobilizar forças que, de outra forma, permaneceriam inativas. É isso que nos acostumou a considerar o mito apenas como uma engrenagem de nosso mundo, a vê-lo como uma simples forma, uma maneira de ver que faz parte de nosso mundo, e não ao mesmo tempo como um olhar lançado sobre o mundo humano a partir da margem oposta, não humana. A nação, a pátria, o sangue e o solo são, do ponto de vista da modernidade, representações "míticas"; Georges Sorel acrescenta a elas o mito da greve geral, outros mobilizam o "mito do século XX", o mito da raça e de sua pureza criadora.
Essa pequena enumeração basta para remontar à origem dessa concepção moderna. Tudo começa em Creonte:
"Não posso considerar meu amigo [isto é, amigo do Estado] um inimigo de meu país.""É àquele que a cidade colocou à sua frente que se deve obediência, tanto nas pequenas coisas quanto no que é justo e no que não o é.""Não há flagelo pior que a anarquia."
O mito falseado é um legado da Antiguidade helenística e romana. Ele nos foi transmitido sob a forma de representações relativas a uma religião de Estado, sob a forma de apoteoses e de deificação das instituições humanas. Claro, essas representações antigas mantinham certa continuidade com o fundo autêntico do mito, uma relação sem a qual a figura de Creonte também seria impossível. Nos tempos modernos, desde a era do culto à "deusa Razão" e da teofilantropia, nos encontramos diante de "mitos" fabricados para atender a necessidades específicos, elaborados em função de interesses sociais. É verdade que Platão, já na Grécia antiga, esboçou e construiu friamente vários mitos funcionais desse tipo. (Pensa-se especialmente no "mito" das três espécies humanas, exposto na República.)
No entanto, Creonte e seu legado não são tudo o que nos separa do que chamamos de "mito autêntico". Há ainda outro obstáculo, uma construção espiritual cuja história não podemos traçar nos limites deste estudo: a metafísica espiritualista, de orientação ética, mesclada com teologia cristã. Como a mitologia, ao contrário do racionalismo cujo escopo se limita ao mundo humano, essa metafísica espiritualista também visa acessar o próprio fundamento do ser — fundamento que, aos seus olhos, não é obscuro, mas sobre-humanamente claro. Ela coloca, no lugar do que é desde tempos imemoriais, primeiro um arquétipo, um modelo, uma Ideia, depois um imperativo e um ideal. Essa interpretação é o que leva à concepção de Antígona como heroína ética, santa ignorante de sua própria santidade. É assim que Jean Anouilh a apresenta, misturando à santidade o tema mais próprio a Creonte (ou a Joana d’Arc) do patriotismo puro, autêntico. Ora, esse espiritualismo nos deixa agora tão incrédulos quanto toda a metafísica grega. A Antígona ética das adaptações modernas, das quais Milan Uhde nos oferece um exemplo [1], não passa, portanto, de uma vã nostalgia de pureza, sem força e sem vida, que reflete no máximo um olhar enviesado para um ideal perdido [2].
Hegel, por outro lado, percebe perfeitamente que Antígona não se situa no solo do cristianismo, mas que sua terra natal é a πόλις grega. O conflito de Antígona representa para ele a cisão interna e a supressão dialética da πόλις. Hegel é o primeiro, nos tempos modernos, a tentar levar Sófocles a sério. Ele descobre o sentido do ritual funerário, o sentido do homem e da mulher, do universal e do singular, o fato de que, nesse mundo ético, a possibilidade de ser um indivíduo só se apresenta na família, ou seja, no mundo dos mortos. Ele descobre o significado das diferentes relações familiares, especialmente a da irmã para o irmão e vice-versa; consegue esclarecer tanto o sentido da morte fratricida de Etéocles e Polinices quanto o amor de Antígona. O comentário hegeliano sobre Antígona é um tesouro único de intuições, de olhares lançados sobre os mistérios do mito antigo. No entanto, Hegel permanece essencialmente distante do mito na medida em que compreende a noite apenas como noite relativa, componente da grande luz universal do ser, segundo uma concepção que, no fundo, concorda com a metafísica espiritualista. É por isso que a noite (a lei divina, as trevas que cercam a geração e o nascimento) é para ele apenas um componente da πόλις, da cidade, do mundo ético — a base familiar sem a qual a πόλις não poderia se manter. Do ponto de vista do mito sofocliano, isso é pouco, embora seja verdade que a família pertence à πόλις. Ao fazer da Noite um componente da cidade (e não o contrário), Hegel coloca Creonte em primeiro plano porque a Noite, como parte, é a tese de Creonte. Apesar de toda sua simpatia por Antígona, Hegel nunca perde a oportunidade de destacar o bom direito de Creonte.
Até mesmo o olhar mais penetrante lançado pelo homem moderno sobre as profundezas da Antígona de Sófocles se coloca, até certo ponto, sob o signo de Creonte. Creonte é nosso ancestral. O pensamento racionalista de Creonte é o precursor de nossa concepção (objetivista, isto é, psicológica e sociológica) do mito, o anúncio tanto de Freud quanto de Durkheim. Da mesma forma, o irracionalismo ativo e prático de Creonte abre caminho para o nosso, para nossas "mito-logias", para os esforços feitos para manipular os aspectos do homem que escapam à esfera da razão, mas contêm toda sua força explosiva.
A Antígona de Sófocles representa, diante disso, um lembrete sem força, lembrete de uma esperança ínfima, apesar da grandeza da realização poética — lembrete daquilo que o pensamento de Creonte ocultou completamente em nós: o fato de que o homem não pertence a si mesmo, que seu sentido não é o Sentido, que o sentido humano termina assim que se alcança a margem da Noite, e que a Noite não é um nada, mas pertence ao que "é" no sentido próprio do termo. Para o espírito grego, o preceito "conhece-te a ti mesmo" não significava outra coisa. Cada episódio, cada coro, cada verso, cada palavra da Antígona de Sófocles é uma expressão desse autoconhecimento.


Ver online : PATOCKA, Jan. L’écrivain, son “ objet”. Paris: Presses Pocket, 1992
[1] A primeira parte do texto de Patocka, omitida na presente tradução, representa uma crítica contundente de A Cativa de Tebas, peça sobre o tema de Antígona apresentada em 1967 pelo dramaturgo, poeta e jornalista tcheco Milan Uhde (nascido em 1936). Cf. infra, "Indicações bibliográficas", p. 283-284. (N.d.T.)
[2] O problema do coração puro, no centro da peça de Uhde, é fundamentalmente estranho à problemática de Antígona. É um problema tipicamente moderno, tratado por dramaturgos cem vezes já com muito mais força e clareza, por exemplo em Os Bandoleiros de Schiller. Na Fenomenologia do espírito, Hegel o evoca no contexto, não do mundo antigo, mas do mundo moderno, sob o título "a lei do coração e o delírio da presunção".