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Jan Patocka. L’écrivain et son "objet"

Patocka – o medo-pavor e a piedade-compaixão

quinta-feira 3 de julho de 2025

A poesia, diz Aristóteles (e ele entende por isso principalmente o drama e, sobretudo, a tragédia), é nitidamente mais filosófica que a historiografia, pois a crônica é uma simples descrição do que foi, dos fatos singulares e, portanto, contingentes, ao passo que a poesia concerne a algo universal, as possibilidades da natureza humana e do destino do homem em geral [1].

O que é essa coisa necessária e sempre possível? Quais são esses aspectos essenciais do humano — não apenas da natureza do homem, mas ainda de seu destino? São a felicidade e a infelicidade, com a lógica dos acontecimentos que a eles conduzem; o envolvimento numa culpa da qual o homem, levado por seu ímpeto ingênuo, não tem consciência; as reviravoltas dos destinos humanos que fazem com que a situação aparentemente mais positiva se revele na realidade a mais terrível e esmagadora; as possibilidades da proximidade humana que dão ao mesmo tempo origem às oposições mais cruéis: o irmão contra o irmão, o filho contra a mãe, a mulher contra o marido...

A isso se ligam dois sentimentos fundamentais, referindo-se, um, ao infortúnio próprio, outro, ao infortúnio alheio: φόβος e ἐλεος (o medo-pavor, a piedade-compaixão). O φόβος intervém onde vemos um perigo que ameaça, que é iminente — o φόβος é o pavor que se apodera de nós quando estamos nós mesmos em perigo, mas pode também se referir aos outros. Podemos sentir medo por nossos próximos e em seu lugar; podemos sentir medo por aquele que não sente nenhum. É aí que se forma o vínculo com o outro sentimento, o ἐλεος, a piedade, a compaixão. O ἐλεος nasce onde vemos sofrer e se precipitar no perigo um homem que não é mau, não porque comete ou cometeu a injustiça, mas porque não se vê, porque não se percebe a si mesmo claramente, porque está cego diante de si mesmo e de sua situação — em suma, onde ele mesmo se lança no infortúnio. Onde ele visa o bem e, devido à sua cegueira, atinge o contrário, é objeto do ἐλεος.

No livro II da Retórica, onde apresenta uma análise dos afetos que o orador deve conhecer, para deles se servir e a eles apelar em seus ouvintes, Aristóteles fala do medo como uma espécie de pânico, "uma dor e uma desordem" que resultam da representação de um mal futuro, ameaçador, terrível em sua iminência, que pode causar a morte ou o sofrimento. O pavor se refere a uma potência preponderante que está próxima e que pode ou deve ter o desígnio de nos aniquilar, da qual não podemos nos subtrair, sobretudo se cometemos um erro irreparável... e ele age também enquanto o golpe não se deu, enquanto resta uma esperança, por mínima que seja, de escapar. O ἐλεος é um sentimento análogo que se refere, não diretamente a nós mesmos, mas aos outros, àqueles que a nosso ver merecem e cujo destino nos parece suscetível de nos atingir, nós também, ou alguém de nossos próximos que de certo modo fazem parte de nós mesmos. O ἐλεος é um sentimento do qual participam aqueles que não são eles mesmos nem felizes nem irremediavelmente infelizes, aqueles que possuem um saber concernente ao mal que poderá atingi-los mas ainda não os atingiu — homens experientes, de idade madura, fracos, prudentes, inclinados à reflexão, preocupados, nem audaciosos e altivos, nem covardes, mas medianos em todos os aspectos, homens que têm confiança na bondade humana e guardam a lembrança do infortúnio que os atingiu ou poderá atingi-los a eles mesmos ou àqueles que lhes são próximos. É um sentimento que nos é inspirado sobretudo por aqueles que são da mesma idade e do mesmo caráter que nós, aqueles que compartilham nossa situação social e nossas disposições espirituais, em geral todos aqueles que nos fazem perceber mais claramente que seu destino poderia nos atingir também, que é o nosso. Por isso a proximidade, a presença do infortúnio ou de seus corpora delicti, sobretudo as palavras dos moribundos, despertam no mais alto grau a compaixão; sobretudo onde vemos o homem que enfrenta essa prova suprema nela encontrar e fazer prevalecer um sentido.

O φόβος e o ἐλεος são portanto sentimentos que se referem à exposição ao perigo que fazem pairar sobre nós a preponderância do exterior, o infortúnio e a morte, perigo que ameaça constantemente nos aniquilar, que não vemos enquanto o julgamos distante, mas que pode na realidade eclodir a qualquer momento, ou mesmo que deve eclodir mais cedo ou mais tarde. E o ἐλεος, em conjunto com o φόβος, o medo pelo outro, pertence à essência da arte mágica, a esse momento específico e diferenciador que se chama a catarse. Como pode ser que essa suprema miséria, essa suprema terrror da vida humana, o que há nela de mais insuportável, se torne o fundamento da arte mais nobre, de algo que se deseja soberanamente por si mesmo?

O φόβος é o pânico mais imediato, encerrado em si mesmo, sem distanciamento nem superação de si. É verdade que, sem isso, a finitude humana seria impossível no conhecimento de si que a torna humana, e no entanto é um desespero insuportável do qual procuramos nos subtrair enquanto nos resta a mínima esperança. O ἐλεος, ao contrário, estabelece uma distância — sabemos que fomos atingidos, sem que ainda o golpe nos atinja em toda sua força. Embora não haja senão um passo da piedade ao pavor, o ἐλεος comporta uma clareira que permite discernir também a possibilidade positiva que encerra o medo da finitude: o homem que enfrenta a prova suprema desperta o ἐλεος mais elevado. Não que o ἐλεος seja em si mesmo algo que desejássemos, algo que exercesse atração sobre nós ou nos fizesse sentir prazer. A piedade também é uma dor, algo negativo que suportamos, mas que não procuramos evocar. Apesar de tudo isso, há um meio que permite não apenas tornar suportável o trágico da vida humana, mas fazer dele o objetivo de uma atividade ao mesmo tempo criadora e receptiva, o objeto do interesse mais elevado.

Esse meio é a μίμησις artística, sobretudo poética e, acima de tudo, dramática. O homem é, de todos os animais, aquele que é "o mais inclinado a representar" [2], aquele que mais aproveita e aprende pela representação, que dela tira o maior prazer. O homem é capaz de suportar até as coisas em si mesmas mais repulsivas, desde que sejam representadas, pelo prazer que proporcionam o acabamento da execução e a exatidão da apreensão [3]. Daí então a possibilidade de purgar também, indiretamente, por meio dessa μίμησις, aquilo de que nos desviamos na realidade. A μίμησις é um gênero de conhecimento, de intelecção, de olhar, de θεωρία; é um olhar lançado sobre um aspecto do homem que este não vê de outro modo, sendo incapaz de suportá-lo, de suportar seu peso. A μίμησις da ação trágica nos permite conhecer o herói, não enquanto ζώον λόγον ἐχων, em seu εἶδος "objetivo" (para empregar o termo moderno), mas em seu destino de mortal, destino que comporta a cegueira, a exposição ao perigo e a explicação com um e outro. Conhecemos aqui o homem finito em sua finitude, naquilo que não pode ser conhecido de fora, mas que cada um deve realizar em si mesmo e por si mesmo. A μίμησις permite ao mesmo tempo realizar e superar a finitude. Graças a ela, vemos a finitude do herói, superamos o herói, mas também nos superamos a nós mesmos, graças ao ἐλεος. Assim a μίμησις artística nos permite atingir, em relação mesmo às coisas que nos são acessíveis unicamente em virtude de nossa finitude, uma universalização que torna possível o distanciamento. A μίμησις torna possível a catarse, a purgação, a transformação, no homem, das dores e dos desesperos interiores mais pessoais e mais cruéis, o ἐλεος e o φόβος, numa profunda compreensão de si. O épos não oferece nada de semelhante. Embora, em sua comparação final do valor da epopeia e da tragédia, Aristóteles não avance expressamente esse ponto em favor da tragédia, isso subjaz de fato a toda sua análise do drama.


Ver online : PATOCKA, Jan. L’écrivain, son “ objet”. Paris: Presses Pocket, 1992


[1Ibid., 51b 5-7. (N.d.T.)

[2Ibid., 48b 7. (N.d.T.)

[3Ibid., 48b 9-19. (N.d.T.)