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Jan Patocka. L’écrivain et son "objet"
Patocka – O escritor e seu "objeto"
Contribuição à filosofia da literatura
quinta-feira 3 de julho de 2025
O descontentamento da intelligentsia, sua nova consciência de si, suas reivindicações, seu agrupamento e solidariedade aparecem como os primeiros indícios de uma época nova da qual ainda não sabemos se trará uma superação da crise assinalada em quase todos os domínios pela impotência da razão diante do absurdo, cuja persistência a realidade presente traduz. Muitos, vendo nesses fenômenos novos apenas o que lembra a agressividade da desrazão, as paixões cegas, a "plebe" no sentido tradicional do termo, tendem a deixar influenciar seu julgamento sobretudo por esses aspectos. Se se busca um critério para distinguir entre a persistência do declínio e a da esperança, o que se oferece é um retorno ao normal, ou seja, à preeminência da razão sobre o puro e simples fato, e o critério da razão é a "objetividade" [1]. Uma evolução supostamente não apenas avançar, mas também ser dotada de sentido, deveria portanto ser uma progressão rumo a uma "objetividade" maior, e como, na história do espírito, tal atitude foi mais de uma vez não apenas visada, mas parcialmente alcançada, dever-se-ia poder falar de um retorno à "objetividade".
Tal "objetividade" pressupõe que saibamos compreendê-la e que a ela nos apliquemos ativamente. A "objetividade" consciente exige ainda que conheçamos nosso "objeto", que saibamos o que há para nós a fazer. Ora, a intelligentsia que atualmente se coloca em primeiro plano preocupa-se com coisas diversas. A intelligentsia criadora, aquela cuja tarefa não é a práxis mas a ποίησχς, pode ser dividida grosso modo em três grupos: técnico, artístico e científico. A técnica, a ciência e a arte criam para o homem possibilidades novas. Embora as outras atividades da intelligentsia — a política, a administração e a organização econômica, o direito, o ensino, a medicina etc. — sejam permeáveis a essas possibilidades e em comunicação permanente com elas, seu papel se limita no fundo à implementação das possibilidades uma vez descobertas e abertas, e à sua conversão em funções constantes.
Vamos aqui nos interrogar sobre o "objeto" essencial do artista e, mais concretamente, sobre o da escrita como gênero artístico particularmente importante. Nossa questão é o "assunto" do escritor, o que há para ele a fazer na charneira de duas épocas, num momento em que o reinado da razão se delineia como possibilidade universal, capaz de fazer o mundo sofrer uma transformação sem precedentes, de derrubar, na medida em que se opõem, as tradições que subsistem de outrora, ou de integrá-las de maneira nova, na medida em que se prestem a uma conciliação. Essa possibilidade é aquela pela qual os intelectuais deverão lutar nas próximas décadas, aquela pela qual deverão colocar em jogo sua energia e talvez ainda mais.
Para bem compreender o fundo do "assunto" do escritor, será preciso começar por considerações abstratas que se afastam um pouco de nosso tema. A obra do escritor é a literatura, a expressão verbal captada pela escrita. A escrita dos escritores é o resultado de um processo de objetivação progressiva da palavra e de sua ação de retorno sobre o homem e suas possibilidades. Será preciso portanto partir de uma análise desse processo.
É antes de tudo a industrialização da cultura e, em particular, da produção literária, que faz do escritor uma engrenagem no mecanismo complicado da oferta e da procura, de tal modo que, se ceder nesse ponto, corre o risco de deixar de ser ele mesmo para se tornar o simples objeto de uma encomenda adventícia.
É em seguida a pressão exercida pela sociedade organizada que recruta o escritor para fins externos, para um engajamento que não decorre interiormente de sua decisão pessoal, mas de uma motivação estranha à sua função de escritor.
Por fim, é a influência dos mass media, que atraem não apenas por razões econômicas, mas também ao oferecer uma influência sobre o público, um acesso a vastas camadas que o escritor de outro modo não poderia alcançar. Ao mesmo tempo, porém, suas exigências levam ao estereotipamento da abordagem e da expressão, privam a expressão de sua diferenciação, de sua flexibilidade, de sua profundidade. Não se trata de dizer que o escritor deva abandonar esse campo à massa jornalística, mas é indispensável que se dê conta do risco que corre de se deixar influenciar também por seu público, de cair assim no conformismo, conservando apenas uma falsa aparência de liberdade.
Todas essas considerações conduzem o escritor consciente de seus interesses essenciais ao centro mesmo do movimento da intelligentsia moderna. Precisamente enquanto individualidade, deve sentir-se solidário com a concepção do interesse comum, que é uma marca significativa de nossa época, época em que essa tendência não representa mais uma simples protestação moral sem poder, mas uma força suscetível de conduzir a sociedade a um futuro novo.


Ver online : PATOCKA, Jan. L’écrivain, son “ objet”. Paris: Presses Pocket, 1992
[1] Vécnost (de véc — coisa, assunto, propósito ou aqui, a contragosto, "objeto"): a Sachlichkeit do retorno husserliano "às coisas mesmas", a distinguir bem (as aspas bastam?) da objetividade (objektivita) científica de que se tratou nas páginas anteriores. (N.d.T.)