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Allemann (1987:263-274) – A questão da essência do poema (resumo)

A QUESTÃO DA ESSÊNCIA DO POEMA

  • A necessidade   de a ciência   literária colocar-se no horizonte da questão da essência e do fundamento do poético para iniciar um   debate sério com o pensamento de Heidegger, superando a mera rejeição ou adesão e as escaramuças sobre a sua "violência  " interpretativa.
  • A meditação   da essência da linguagem   poética como uma das tarefas mais insondáveis, que ultrapassa em muito um problema estético e toca na questão inaudita da possibilidade   de o homem   ter uma morada poética numa terra   tornada planetariamente manipulável.

A AUSÊNCIA DE FUNDAMENTO METAFÍSICO DA POESIA  

  • A exigência de abandonar a concepção corrente da linguagem como instrumento de comunicação e informação para que a questão de uma relação essencial com a linguagem se torne uma questão fundamental para o Dasein humano.
    • O estabelecimento de uma nova relação com a linguagem como condição para a superação (Verwindung) da Metafísica  .
    • A extrema dificuldade e o perigo de depreciar esta tarefa, manifestando o desejo de soluções prematuras para "superar" o Niilismo  .
  • A inseparabilidade entre a questão do modo futuro do dizer pensante e poético e a questão do ser   e do esquecimento do ser  , sendo impossível estabelecer uma analogia   entre a História   do ser no pensamento de Heidegger e uma "História" da poesia.
  • A incongruência entre a essência do poético e o aparato conceptual da Metafísica, que força   as tentativas de aproximação a efetuarem-se pela negação  , como se verifica no Idealismo alemão com as determinações de "ausência de finalidade" e "prazer desinteressado".
    • A consequência desta incongruência: a poesia aparece na era metafísica como o "outro" do corrente e dominante, sendo-lhe prescrito o domínio do irracional sob o reinado da razão moderna.
    • O círculo vicioso de opor o poético, enquanto irracional, ao racional dominante, permanecendo assim encerrado no horizonte de um racionalismo não pensado até aos seus limites.
  • A necessidade de uma meditação mais profunda e histórica sobre as noções correntes de razão, fundamento, irracionalidade e ausência de fundamento, tal como Heidegger a empreendeu em Da Essência do Fundamento e em O Princípio de Razão.
    • A interpretação   heideggeriana do verso de Angelus Silesius, "A rosa é sem porquê; floresce porque floresce", não como uma ausência de fundamento, mas como um puro aparecer, um puro irradiar, uma eclosão a partir de si mesma (φύσις), onde o próprio ser se torna visível como fundamento do belo e do poema.
    • A regressão à essência grega do λόγος, para além do conceito latino de ratio, como a dimensão onde o fundamento do poema e aquilo em que ele é sem fundo poderão ser meditados.
  • A essência da verdadeira leitura  , para Heidegger, desvela-se na remontagem ao λόγος e ao λέγειν dos primeiros Gregos, um domínio onde não se pode ainda falar de uma ruptura da linguagem em "língua da poesia" e "língua da prosa".
    • O impulso renovado que esta regressão oferece à investigação alemã para medir a possibilidade do poético também na "casa mais pobre" da sua própria língua, e a nova profundidade que confere ao debate poético do pensamento alemão com a língua grega, exemplificado na obra tardia de Hölderlin  .

A PRO-DUÇÃO POÉTICA

  • A identificação entre a questão do "fundamento" da poesia e a questão da essência histórica do poema, quando se pensa "historial" com resolução no sentido   heideggeriano, para além do domínio do meramente histórico.
  • A abertura para o verdadeiro fundamento da poesia através da regressão heideggeriana do conceito de causa   (causa) ao pensamento grego da αἰτία (o "estar implicado em", o "ter culpa no" sentido de ser responsável pelo advento de algo).
    • A tradução de causare não por "produzir um efeito" (verursachen), mas, mais originariamente, por "con-duzir à libertação" (ver-an-lassen), revelando a relação com a pro-dução (poiesis) [1] e, portanto, com a poesia.
    • A compreensão   das quatro causas (material, formal, final e eficiente) como modos de "estar implicado" que, em sua unidade, libertam algo para a dimensão da pre-sença, deixando-o ser o que é na plenitude do seu vir à luz  .
  • A compreensão da poiesis como pro-dução em sentido amplo, que abrange não só a produção artística e poética, mas também a physis   (a eclosão a partir de si), sendo tanto a técnica (techne) quanto a poesia modos de desocultação (aletheia  ).
    • A consequência essencial de que a poesia, pensada a partir da poiesis, aparece como um dos modos da manifestidade do ser e determina, de forma   tão originária quanto a essência da técnica, o Dasein do homem na terra.
  • A exigência de que a ciência do poético, para se aproximar da essência do poético, deve engajar-se nas vias últimas e mais difíceis do pensamento de Heidegger, não podendo contentar-se com uma simples redução ao nível do pensamento preparatório de Ser e Tempo   nem com uma mera aplicação da questão do ser ao domínio do poético.
    • A necessidade de ter constantemente presente o abismo entre o pensamento e a poesia, reconhecendo que o questionamento pensante é uma proeza, mas que o poético da arte   superior é, de outra maneira, também "preux" (πρῶμος), obediente ao reinado e à guarda da verdade.

Ver online : Beda Allemann


ALLEMANN, Beda. Hölderlin et Heidegger. Paris: PUF, 1987.


[1Pro-dução traduz a palavra Her-vor-bringung. Bringen significa portar, conduzir ao lugar onde aquilo que é portado tem o seu lugar.

Her indica uma revelação, no sentido em que aquilo que é portado ao seu lugar provém de um outro lugar onde estava retirado (por exemplo, ao olhar).

Vor assinala uma apresentação onde aquilo que é apresentado vem para a frente, produz-se.

Deve-se, portanto, compreender a pro-dução como eclosão, a partir de um retiro, daquilo que se apresenta na irradiação de sua essência própria. (N. do T.)