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Verdade e Método

Gadamer (VM) – Atemporalidade do Estético

2.1.3. A temporalidade da estética (tópicos)

  • A problematização da simultaneidade e da pretensa a-temporalidade do ser   estético, questionando-se a inadequação de determinações dialéticas que se limitam a opor uma temporalidade histórica a uma supra-histórica ou um   "tempo   sagrado", sem conseguir pensar   sua essencial correlação, tal como abordado por Hans Sedlmayr com referência a Franz von Baader e Otto Friedrich Bollnow.

  • A crítica   à apropriação equivocada da análise heideggeriana do tempo de Martin Heidegger, onde se perde o sentido   metodológico da temporalidade da pre-sença (Dasein) como modo de ser   da compreensão  , reduzindo-a a uma mera possibilidade   entre outras e buscando contrapor-lhe um "tempo sagrado" para a arte  .

  • A afirmação de que apenas uma teologia bíblica, fundada na revelação divina e não na autocompreensão humana, poderia legitimamente falar de um "tempo sagrado", e que, sem essa fundamentação, tal conceito apenas encobre o verdadeiro problema da temporalidade da obra de arte.

  • A retomada da questão pela temporalidade própria da obra de arte a partir de sua natureza   como jogo  , cujo ser verdadeiro é inseparável de sua representação e se manifesta como uma unidade configurada que permanece idêntica através de suas múltiplas apresentações.

  • O caráter de repetição inerente à representação artística, entendida não como uma cópia de um original, mas como uma repetição que é, ela mesma, originária, constituindo a própria obra.

  • A analogia   com a estrutura   temporal da festa, cujo retorno periódico não é uma festa diferente nem uma mera recordação, mas uma celebração que constitui um presente sui generis, cujo ser reside em ser celebrada e que, portanto, só existe no devir e no retornar.

  • A conceituação do espectador   como aquele que toma-parte (Dabeisein), uma forma   de participação que vai além da mera co-presença e que remete ao conceito grego originário de theoria como participação em uma delegação festiva, um puro tomar-parte no ser verdadeiro.

  • A descrição do theoros (espectador) não a partir de um comportamento subjetivo, mas a partir daquilo que ele contempla, caracterizando a theoria como uma verdadeira participação, um pathos ou um "ser arrebatado pela visão  ", revelando seu pano de fundo religioso.

  • A definição do verdadeiro ser do espectador pelo estar-fora-de-si (Aussersichsein), entendido não como uma negação   privativa, mas como a possibilidade positiva de um auto-esquecimento que surge da dedicação total à coisa vista, constituindo um desempenho positivo, uma ideia que Platão já havia assinalado em seu diálogo Fedro.

  • A distinção crucial entre o espectador que se entrega ao jogo da arte e a mera curiosidade, cujo estímulo se esgota na novidade abstrata, enquanto a experiência   artística inclui uma reivindicação de duração.

  • A exploração do conceito de reivindicação (Anspruch), entendido como algo duradouro que fundamenta uma exigência indeterminada e que, para se tornar válida, deve assumir a forma de uma exigência concreta, aplicando-se analogicamente à teologia da pregação, particularmente na teologia de Martin Lutero, e à experiência da arte.

  • A definição da simultaneidade no sentido de Søren Kierkegaard  , não como um ser-ao-mesmo-tempo de objetos na consciência  , mas como uma tarefa para a consciência: a intermediação total com algo individual e remoto, de modo que este alcance plena atualidade, um conceito que a teologia dialética, estimulada por Kierkegaard, explorou.

  • A aplicação do conceito de simultaneidade à experiência da arte, onde a intermediação deve ser pensada como total, destacando o que é representado dos moldes usuais do mundo   e concentrando-o em um núcleo de sentido independente.

  • A descrição da distância estética não como um afastamento, mas como uma condição de possibilidade para uma participação genuína e abrangente naquilo que é representado.

  • A paradoxal correlação no espectador entre o auto-esquecimento estático e a continuidade consigo mesmo, onde justamente aquilo em que ele se perde exige dele a continuidade do sentido, reconhecendo no espetáculo a verdade   de seu próprio mundo religioso e ético.

  • A conclusão de que a dependência do ser estético em relação à representação não é uma carência, mas parte integrante de seu ser próprio, sendo o espectador um momento essencial do espetáculo estético, tal como expresso na definição aristotélica da tragédia   na Poética de Aristóteles, que inclui explicitamente a disposição do espectador.


Ver online : Hans-Georg Gadamer


GADAMER, Hans-Georg. Verdade e Método. Tr. Flávio Paulo Meurer. Petrópolis: Vozes, 1999.