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Huxley: Conhecimento e Compreensão
domingo 23 de novembro de 2025
O conhecimento é adquirido quando se logra inserir uma nova experiência no sistema de conceitos baseado em nossas experiências anteriores. A compreensão surge quando se liberta do antigo e assim se torna possível um contato direto e não mediado com o novo, o mistério, momento a momento, de nossa existência .
O novo é dado em todos os níveis da experiência — percepções dadas, emoções e pensamentos dados, estados de consciência desobstruída dados, relações dadas com coisas e pessoas. O antigo é o nosso sistema caseiro de ideias e padrões verbais. É o estoque de artigos acabados fabricados a partir do mistério dado pela memória e pelo raciocínio analítico, pelo hábito e pelas associações automáticas de noções aceitas. O conhecimento é primordialmente um conhecimento destes artigos acabados. A compreensão é primordialmente a consciência direta da matéria -prima.
O conhecimento se exprime sempre em termos de conceitos e pode ser transmitido por meio de palavras ou outros símbolos . A compreensão não é conceitual e, portanto, não pode ser transmitida. É uma experiência imediata, e a experiência imediata pode apenas ser comentada (muito inadequadamente), nunca compartilhada. Ninguém pode sentir efetivamente a dor ou o pesar de outrem, o amor , a alegria ou a fome de outrem. E, de modo semelhante, ninguém pode experimentar a compreensão de outrem acerca de um determinado evento ou situação. Pode, é claro, haver conhecimento de tal compreensão, e esse conhecimento pode ser transmitido pela fala ou pela escrita, ou por meio de outros símbolos. Tal conhecimento comunicável é útil como lembrança de que houve compreensões específicas no passado e de que a compreensão é possível em todo momento. Mas sempre cumpre recordar que o conhecimento da compreensão não é o mesmo que a própria compreensão, que é a matéria-prima daquele conhecimento. É tão diferente da compreensão quanto a receita médica de penicilina é diferente da penicilina.
A compreensão não é herdada, nem pode ser laboriosamente adquirida. É algo que, quando as circunstâncias são favoráveis, vem a nós, por assim dizer, de seu próprio impulso. Todos somos conhecedores o tempo todo; somente ocasionalmente e a despeito de nós mesmos compreendemos o mistério da realidade dada. Consequentemente, somos muito raramente tentados a igualar compreensão a conhecimento. Dos homens e mulheres excepcionais, que possuem compreensão em toda situação, a maioria é suficientemente inteligente para ver que compreensão difere de conhecimento e que sistemas conceituais baseados na experiência passada são tão necessários à condução da vida quanto os insights espontâneos acerca de novas experiências. Por estas razões, o erro de identificar compreensão com conhecimento raramente se perpetua e, portanto, não representa problema sério.
HUXLEY , Aldous. The Divine Within: Selected Writings on Enlightenment. New York: HarperCollins Publishers, 2013.
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