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Ursula K. Le Guin – O livro é o que é real

quarta-feira 9 de julho de 2025

Quando criança, dava muito pouca atenção aos nomes dos autores; eram irrelevantes; não acreditava em autores. Para ser perfeitamente franco, isso ainda é verdade. Não acredito em autores. Um livro existe, está ali. O autor não está ali — algum adulto que nunca se conheceu — pode até estar morto. O livro é o que é real. Lê-se o livro, forma-se com ele uma relação, talvez trivial, talvez profunda e duradoura. Ao lê-lo palavra por palavra e página por página, participa-se de sua criação, assim como um violoncelista tocando uma suíte de Bach participa, nota por nota, da criação, do surgimento, da existência da música. E, ao lê-lo e relê-lo, o livro, é claro, participa da criação do leitor, seus pensamentos e sentimentos, o tamanho e o temperamento de sua alma. Onde entra o autor em tudo isso? Como o Deus dos deístas do século XVIII, apenas no começo. Há muito tempo, antes que o leitor e o livro se encontrassem. O trabalho do autor está feito, completo; o trabalho contínuo, o ato presente de criação, é uma colaboração entre as palavras que estão na página e os olhos que as leem.

Ursula K. Le Guin Le Guin Ursula K. Le Guin (1929-2018) , “Books Remembered,” Children’s Book Council Calendar xxxvi, no. 2 (novembro de 1977)