Página inicial > Ditados > René Daumal – Diálogo laborioso sobre o poder das palavras (2)
La Grande beuverie
René Daumal – Diálogo laborioso sobre o poder das palavras (2)
Dialogue laborieux sur la puissance des mots et la faiblesse de la pensée II
terça-feira 1º de julho de 2025
Estávamos em uma fumaça espessa. A chaminé não puxava bem, o fogo de lenha verde demais se retraía, as velas liberavam um vapor rançoso no ar, e as nuvens de tabaco formavam bancos azulados à altura dos rostos. Se éramos dez ou mil, já não sabíamos. O certo é que estávamos sós. A propósito, a grande voz detrás dos feixes de lenha, como a chamávamos em nossa linguagem de sedentos, tinha-se elevado um pouco. De fato, ela saía de trás de um monte de feixes de lenha, ou de caixas de biscoito — era difícil saber, por causa da fumaça e do cansaço —, e dizia:
— Quando está só, o micróbio (ia dizer: o homem) clama por uma alma gêmea, como se choramingasse, para fazer-lhe companhia. Se a alma gêmea chega, já não suportam ser dois, e cada um começa a se enfurecer para tornar-se um com o objeto de seus atritos intestinos. Isso não faz sentido: um quer ser dois; dois, quer ser um. Se a alma gêmea não aparece, ele se divide em dois, diz a si mesmo: olá, meu velho, lança-se nos próprios braços, cola-se de maneira torta e se toma por alguma coisa, senão por alguém. No entanto, só há uma coisa em comum: a solidão; ou seja, tudo ou nada — depende de si.
Achamos que estava bem dito, mas ninguém se preocupava em ver quem falava. Só se falava em beber. Até então, só havíamos tomado canecas de um destilado infecto que nos deixara ainda mais sedentos.


Ver online : DAUMAL, René. La grande beuverie. Éd. nouvelle ed. Paris: Gallimard, 1994
DAUMAL, René. La grande beuverie. Éd. nouvelle ed. Paris: Gallimard, 1994.