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Nancy (Scène) – retorno à questão da subjetividade
segunda-feira 30 de junho de 2025
Como se pode imaginar, não vou defender um desses enfadonhos “retornos ao/ do sujeito” que alguns se esforçavam por promover há algum tempo. Ao contrário, estou plenamente convencido de que estamos no fim da subjetividade entendida como a presença-a-si que sustenta as representações e que as refere a si mesma como suas – sendo ela própria, precisamente, irrepresentável. Mas eu diria antes que o irrepresentável talvez seja ele mesmo apenas um efeito programado pelo sistema da subjetividade. E pergunto-me, por conseguinte, se o lugar desse sujeito não permanece a ser ocupado de novo, ou, talvez dizendo de forma menos imprecisa, se esse lugar, enquanto local do “face a face” com o mundo, do “vis-à-vis” da manifestação em geral, não permanece a ser aberto e disposto de outro modo.
Vis-à-vis: poderia se deter nisso, a saber, no que faz com que, ao contrário do sujeito, para o qual há espetáculo, fenômeno, mas que não é olhado, visado pelo fenômeno, sendo ele mesmo neutralizado na objetividade – ao contrário, portanto, do sujeito –, aquele que eu chamaria de bom grado aqui de espectador só é o que é porque também é olhado, visado pelo que olha ou contempla, e assim envolvido – envolvido e compartilhado – num jogo, numa troca, numa circulação e numa comunidade que pertencem a uma economia totalmente distinta daquela da representação subjetiva. No “arqui-teatro” de que falas, creio que seria necessário saber analisar como o arqui-espectador é olhado a partir da arqui-cena, tanto quanto ele a olha. Isto é, no fundo, como lhe chegam o mito (mesmo que se retorne a esse termo) e a comunidade que o recita.
Seria então tentado a entender que o "prazer" (chairein, alegrar-se com o que agrada, com o que é belo, favorável, benevolente, com o que inspira gratidão...) de que fala Aristóteles indica que o "homem" a cuja "natureza" pertence não é um "sujeito da representação", mas, antes, um existente definido por um certo ser-fora-de-si, por uma participação ou por um compartilhamento da manifestação como tal, ou seja, daquilo que coloca algo, em geral, fora de si – idêntico e diferente, ou, nem simplesmente idêntico, nem simplesmente diferente (é assim que, nesse mesmo ponto, Aristóteles descreve a mimèsis que nos "alegra"). O que arranca a coisa da imanência do ser e a expõe no aparecer. O espectador aristotélico é, por sua vez, exposto, ou melhor, as duas exposições estão presas uma na outra, indissociáveis e irredutíveis a uma relação de sujeito para objeto.
(Acrescento aqui, depois de reler a sua carta: é o que eu queria indicar, de um jeito ou de outro, por uma distinção entre a identidade e a ipseidade, mais ou menos retomada de Bataille, que de fato não é muito sólida no plano das palavras. Trata-se, mais uma vez, da questão: qual nome para o alguém que não é sujeito, e nem por isso, singularmente, é um?)
É aí que eu veria a primeira camada arqueológica do que nomeia "arquiteatro". Algo, de fato, que nada deve ao "espetáculo" entendido como exterioridade representativa, como decoração e ilusão. Mas, no entanto, algo que tem a ver, de maneira essencial, com uma exterioridade, com um aparecer – com o aparecer do ser, ou mesmo como ser. E isso implica a figura. Ou melhor: a figura – e a cena – estão inscritas nessa arquinecessidade do ser, ou, se quiser, nessa mimética ontológica que deve, de uma forma ou de outra, estar no pano de fundo da Poética. Um pano de fundo totalmente oposto ao platonismo que eu evocava há pouco (ao qual, sem dúvida, Platão não se reduz, como mostram as suas próprias complicações com a mimèsis, nas quais é especialista).
Certamente não é por acaso que o teatro hoje conhece menos uma "crise" do que uma espécie de suspensão generalizada. Ele é atingido em cheio pela realização desse platonismo. É por isso que é dividido, ou melhor, dilacerado, entre o espetacular e o apagamento. O "impacto visual", como diz, e o "nada a ver" (seguido de: "Circulem! não há mais lugar de reunião da cidade!"). O puro aparecer em sua acepção mais banal, ou o ser reprimido em uma pura imanência a si mesmo.
Para além da suspensão entre espetacular e apagamento (essa foi sem dúvida, à sua maneira, toda a questão de Beckett Beckett BECKETT, Samuel (1906-1989) ), reabrir uma cena, ou abrir uma nova cena, supõe reabrir ou abrir o espaço de uma figuralidade ontológica (à qual suponho Aristóteles sensível, assim como lhe supõe uma "intuição profunda do teatro" tal como o entende: pouco importa se projetamos sobre ele ou não...). Parece-me que esse é o essencial do nosso assunto. Essa figuralidade ontológica não estaria presa no que batizou como "ontotipologia". Pareceria com isso, se quiser, mas como o seu exato reverso e como a deposição do que o tipo impõe.
Mas então, espaço não pode ser uma palavra vã, nem uma cláusula de estilo. Aquilo de que se trata – a própria "cena" – exige a abertura da exterioridade como tal, do "fora" enquanto tal: ou seja, para mim, daquilo que faz com que um "sentido" seja ou melhor, faça "sentido", sua articulação, sua proferição. De forma muito simples, e sempre muito próxima, creio, do que me escreve, uma enunciação em vez de um enunciado. Que é proferido (enunciado, dito, fraseado), e como o é. Ou mais precisamente: que, isto é, como. O fato da enunciação é indiscernível de sua modalidade – de sua pragmática, dir-se-ia hoje. Essa modalidade forma a condição, não acessória, mas, se posso dizer, transcendental da emissão de um sentido enquanto sentido. Ao mesmo tempo sua condição "pública" ou "comunicativa", e sua condição de reconhecimento (pela qual toca a mimèsis). Como em toda circunstância, inclusive a mais humilde, o que conta é como é dito...


Ver online : LACOUE-LABARTHE, Philippe; NANCY, Jean-Luc. Scène suivi de Dialogue sur le dialogue. Paris: C. Bourgois, 2013
LACOUE-LABARTHE, Philippe; NANCY, Jean-Luc. Scène suivi de Dialogue sur le dialogue. Paris: C. Bourgois, 2013.