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Robert Amadou – literatura e ocultismo

segunda-feira 30 de junho de 2025

A mais eficaz das chaves de que dispomos para decifrar o universo é provavelmente a poesia, em sentido amplo a poesia dos poemas, mas também a que se difunde sobre as modas de expressão. Desde o momento em que uma literatura ultrapassa a totalidade dos modos de expressão, se carrega em determinada medida de poesia e se preocupa então em iluminar determinadas relações existentes entre as coisas, as relações mútuas dos homens, a situação dos entes e sobretudo a dos homens no conjunto de um universo em constante devir. Não é possível compor um verso belo, não se pode criar uma obra que valha a pena e que não revele esta concepção da literatura, e não possa se encaixar neste esquema.

Como seria possível, nestas condições, que não existissem estreitas relações entre a arte e o ocultismo e, mais particularmente, entre o ocultismo e a literatura? Mais próximo da ciência que da arte, porque constitui uma forma mais explícita do conhecimento, o ocultismo está também muito perto da arte, mais que as ciências, pelos meios que utiliza para alcançar este conhecimento. Esta posição equívoca contribuiu frequentemente para seu descrédito, por parecer demasiado literária aos cientistas e excessivamente pedante aos literatos. Mas ocorre também, e é um dos fins desta antologia o demonstrar, que determinados escritores, entre os mais grandes, compreenderam o valor das especulações ocultistas e o magnífico trampolim que podem representar para seu próprio pensamento. Em suma, para o artista, como para o ocultista, o objetivo supremo é um conhecimento, um conhecimento de ordem subjetiva, ou seja, relacionado especialmente com o sujeito, ou melhor ainda, como foi dito mais acima, um conhecimento que se esforça por se situar em uma região em que a oposição entre o subjetivo e o objetivo não tem demasiado sentido, posto que tudo corresponde com tudo. Tanto para o ocultista como para o artista, este conhecimento—mesmo se utiliza técnicas já constituídas, como é o caso da alquimia (ou da prosódia)—é, antes de tudo, o fruto de uma experiência interior.

Seria fácil sublinhar o paralelismo geral dos traços principais e citar os pontos de contato particulares. Para nós há um ponto, que é capital, quando se pensa na noção das analogias. «A imaginação é a mais científica das faculdades humanas—dizia Baudelaire Baudelaire Charles Baudelaire (1821-1867) —, porque ela só compreende em si mesma a analogia universal.» Levando-nos desta forma além de toda oposição entre a ciência e a arte, a analogia nos conduz também ao ponto interior em que existe uma perspectiva única, em que a criação poética e a metodologia ocultista aparecem como singularmente idênticas. A imagem poética, a das correspondências e as alquimias verbais, a que definia em uma ocasião Pierre Reverdy, aparece como a intuição das analogias ocultas, das quais o ocultismo é a ciência, e altera a ordem estabelecida dos fenômenos; mais ainda, limita o valor desta ordem e destrói sua pretensão universalista. O ocultista, o poeta, buscam além da realidade social e do mundo racional o cosmos regido pelas correspondências. O ocultismo e a poesia são, desta maneira, um jogo, o movimento gratuito da inspiração, da escrita automática e das mesas espiritualistas. Somente a vontade de seus adeptos é capaz de pô-las a serviço da sociedade. Durkheim assinalava de maneira acertada que não existe uma igreja mágica. Mas o ocultismo realiza esta paradoxo: escapa ao social, mas se apoia no sagrado que se opõe ao profano e, no entanto, lhe serve de base. Desta forma, os poetas e os ocultistas compartilham o mesmo gosto pela utopia, idênticas tendências revolucionárias, e as mesmas reações os acolhem na sociedade que os retém apesar de tudo isso.

Estas reações são: assombro, surpresa, escândalo e hostilidade, que se manifestam também em forma de burla.

Mas ao mesmo tempo, e isto é sem dúvida o que mais importa, o poeta e o ocultista podem fazer uma boa parte do caminho juntos para outras realidades, as da vida mística. Foi uma vez mais André Breton o que expressou melhor a relação da analogia poética (ou ocultista) com a analogia mística. «A analogia poética—diz—tem em comum com a analogia mística que transgride as leis da dedução para fazer apreciar ao espírito a interdependência de dois objetos de pensamento, situados em planos diferentes, entre os quais o funcionamento lógico do espírito não é apto para proporcionar nenhum ponto e se opõe, a priori, a que se proporcione nenhum ponto. A analogia poética difere em grande medida da analogia mística, precisamente no fato de que não pressupõe de nenhuma forma, através da trama do mundo visível, um universo invisível que tende a manifestar-se. É sem dúvida empírica em seu quehacer e somente o empirismo pode assegurar-lhe a total liberdade de movimento necessária para o fim que deve cumprir. Considerada em seus efeitos, é certo que a analogia poética parece, como a analogia mística, militar a favor de uma concepção de um mundo ramificado até perder-se de vista, e em sua totalidade percorrido pela mesma energia, mas se mantém sem nenhum obstáculo no quadro do sensível, ou seja, do sensual, sem marcar nenhuma propensão a verter-se sobre o extranatural. Tende a fazer entrever e valorizar a verdadeira via «ausente» e não apoia no devaneio metafísico sua substância, não sonhando nem um instante em fazer girar suas conquistas para a glória de qualquer tipo de além.» É verdade que a empresa ocultista, o mesmo que a empresa poética, exige de seus fiéis o gozo da mais absoluta liberdade e que levem suas experiências até além de toda sujeição intelectual. Mas também é certo que, como admitiu André Breton, o mundo conhecido pela analogia aparece como um mundo unido, no qual todas as coisas se manifestam sem número, peso, nem medida. É verdade que a contemplação ativa deste universo eleva a alma de seus profetas para o princípio de ordem e unidade, que depois de tê-lo instaurado mantém a ordem e a unidade sem cessar. No cume do ocultismo, o sábio encontra a teosofia, e sua revelação é tanto mais viva, quanto que ele nunca teria sonhado em poder encontrá-la. Consideremos somente o caminho percorrido pelos autores, tão diversos no entanto, que se reuniram neste volume. Como não encontrar a Deus, que permanece imanente menos que se o busque? O ocultismo é uma filosofia e se utilizaria inadequadamente com outro fim que não fosse a busca de uma especial visão do universo. A poesia não é senão uma visão expressa do mundo, e estas duas visões são similares. Mas circula a mesma seiva pelo tronco e através dos ramos.

«Existem na Sofia—diz Jacob Boehme—recantos nos quais se encontram as relações e as marcas exercidas sobre as mais díspares das criaturas.» O estudo da signatura das coisas pode ajudar a reconhecer estes recantos ocultos e adivinhar sua origem. Um inventário mesmo sumário dos escritores ocultistas mostra que este estudo é comum ao ocultismo e à poesia e que tanto um como outra obtêm deste estudo idêntica conclusão religiosa.

Poder-se-ia mostrar, entrando em detalhes, uma história da literatura em suas relações com o ocultismo. Se não fazemos isto aqui é porque nos parece que esta história se fará espontaneamente, por si mesma, ao ler a antologia e deixando que falem os textos. No máximo que faz falta é indicar algumas correntes particulares. Se é possível falar de ocultismo de uma forma muito geral e como se apresentasse uma unidade relativa, não se pode tampouco silenciar sua pluralidade. No seio do ocultismo existem numerosas moradas, há ciências ocultas e doutrinas esotéricas cujas diferenças são com frequência importantes. Ante ambições deste tipo e mediante métodos analógicos, segundo as disciplinas e de acordo com os temperamentos, as vias do ocultismo são muito variadas. Sem tentar uma classificação das ciências ocultas, que nos levaria demasiado longe, pode-se dizer que ao redor das ciências constituídas existe com frequência uma zona ou franja que corresponde ao domínio do oculto; desta forma, ao redor da matemática há uma ciência mística dos números; em relação com a astronomia temos a astrologia, em torno da química gravita a alquimia, etc. Nesta franja que as ciências desdenham estudar, provisória ou definitivamente, para que se constitua um conhecimento positivamente definido, existem fatos preciosos, em ocasiões inclusive as únicas coisas apreciáveis, os centros de perspectiva desde os quais se marcha mais longe e mais adequadamente. Estes são os objetos que as irmãs ocultas das grandes ciências tratam de recuperar e conservar. Da mesma forma poderia-se dizer que ao lado da teologia, positiva e nitidamente definida pelas grandes religiões, como o cristianismo, existe um saber de Deus, irreductível por razões muito variáveis às construções dogmáticas, constituindo uma teosofia que pertencerá igualmente a nosso domínio.


Robert Kanters & Robert Amadou. Antología del ocultismo. Madrid: Madrid, 1976