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Jan Patocka. L’écrivain et son "objet"

Patocka – linguagem e escrita

quinta-feira 3 de julho de 2025

O próximo passo da dialética pela qual o homem se torna expressamente um ser vivente espiritualmente, ou seja, em uma relação explícita e consciente com o mundo, é a escrita, a fixação da expressão verbal. A necessidade de fixação é muito antiga, primordial, como se depreende da estereotipia da narração inicialmente oral, da precisão ritual com que os mitos são transmitidos, das figuras que facilitam a recitação e a memorização. Com a escrita, que transforma a fala em algo que pode ser conservado, a objetivação da fala e as possibilidades do homem atingem um grau suscetível de acumulação, controle, revisão e, de modo geral, de vida no domínio da memória objetiva. A esfera da atualidade, assim como a da não-atualidade acessível, se amplia e se consolida em grande medida. Mostra-se que o caminho que conduz o homem às profundezas, para dentro de si mesmo, é originalmente um caminho que leva para fora. Sem a fixação da fala, sem a técnica adventícia da escrita que encarna a palavra transformando-a em algo sólido, o homem não teria passado, não poderia viver em seu passado, não teria nem historiografia, nem poesia (no sentido de uma vasta composição que testemunha engenhosidade formal, onde o todo e as partes se pressupõem mutuamente), nem ciência, mesmo que apenas sob a forma de um formulário, de um compêndio de práticas e técnicas relativas a um objeto determinado.

O surgimento da escrita, ao possibilitar o controle da expressão verbal e da significação fixada nela, abre três possibilidades distintas de realização da significação assim fixada e objetivada.

A primeira é aquela realizada originariamente na carta, no documento, no registro, no aviso, hoje sobretudo nos jornais. É a tendência a alcançar um destinatário, a conservar e reproduzir o documento, a ampliar e acelerar a documentação. Todos esses discursos conservam seu caráter situacional, sua subjetividade — todos tratam do que é relevante para o emissor e o destinatário. O que muda são os meios pelos quais essas tendências são realizadas. Os meios se tornam cada vez mais objetivos e mecânicos, técnicos, confiáveis, rápidos, acessíveis, a ponto de tornar possível a presença quase instantânea dos componentes relevantes do mundo e, portanto, o encontro, a troca de ideias, o diálogo em um plano tecnicamente novo: no nível da presença artificial e do contato mediado pela técnica. A expressão linguística, verbal, no entanto, mantém o impulso objetivo característico da situação de fala — a linguagem passa despercebida, se apaga diante daquilo de que se fala.

A segunda possibilidade é aquela para a qual convergem os esforços conjugados da ciência e da filosofia na Antiguidade grega: a determinação, a definição das significações utilizadas tanto na vida cotidiana quanto na prática especializada. A filosofia descobre muito cedo que usamos as palavras sem possuir seu significado preciso, sem saber formular com elas algo além de ideias e opiniões inconsistentes, incompatíveis com outras igualmente plausíveis; ela impulsiona a busca do incontestável. Na geometria, encontra-se o primeiro objeto elementar — figuras planas simples das quais se pode falar sem contradição e de modo que cada palavra tenha um significado precisamente determinado, ao qual sempre se possa retornar e sobre o qual todos os que pensam possam concordar. Mostra-se ainda que, com base em um número reduzido de significações, representações e proposições, é possível na geometria esgotar todos os enunciados verdadeiros relativos a um objeto dado. A tendência à determinação das significações, à sua definição, à delimitação de seu lugar em um sistema, não cessa desde então de ganhar terreno. Cria-se uma nova linguagem, diferente da da vida cotidiana, uma linguagem unívoca, com significações de uma precisão ideal, não apenas desvinculadas da situação, mas livres de todas as perspectivas e atitudes subjetivas arbitrárias. Essa tendência, que visa à objetividade pela exclusão de qualquer componente subjetiva, caracteriza já a ciência antiga e, mais ainda, a dos tempos modernos, em particular a ciência matemática da natureza. A ciência antiga domina assim ilhotas isoladas do real (as figuras planas e sólidas, o equilíbrio dos corpos, a reflexão da luz), a moderna tenta dominar do mesmo modo a natureza em sua totalidade.

Por fim, a última via, a que mais nos interessa aqui, é uma intenção que visa ao sentido da vida, à aspiração por uma apreensão explícita do sentido por meio da linguagem natural. Há uma diferença fundamental entre o sentido simplesmente vivido e o sentido expressamente apreendido, porque formulado. Vivenciamos mais do que somos capazes de apreender, formular, expressar. No entanto, o vivido que permanece não formulado é apenas um meio-vivido. Nossa vida não está originalmente orientada para si mesma, mas sim para aquilo com que se ocupa, para as coisas que nos interessam, das quais nos preocupamos e nas quais encarnamos nossa vida. A vida humana é, antes de tudo, vida no esquecimento de si. Fugimos de nós mesmos porque não refletimos sobre nós mesmos, não nos vemos, não estamos no centro de nossa própria atenção. Consequentemente, a conexão significativa que nossa atividade realiza efetivamente está apenas em nossa vida, e não diante de nós como um tema. Na vida cotidiana, estamos plenamente ocupados em resolver os problemas que nossa situação nos coloca, sem ver essa situação como tal; só nos aparece o que ela exige de nós, apenas isso é fenômeno. Através de nossa situação, estamos como que aprisionados no mundo como em um conjunto de fatos e eventos singulares, pois através da situação momentânea nos relacionamos sempre com o singular: com os exercícios escolares presentes, com a turma presente onde tenho a tarefa de ensinar às crianças a lição presente, com os prédios e pontos de ônibus da rua específica da cidade específica onde moro e onde tenho meu lar, meu local de trabalho, etc.

No entanto, acabamos de ver que, com a objetivação da linguagem, essa situação pode se inverter em grande medida. Ao criar arquiteturas linguísticas estáveis, coisificadas, objetivadas, criamos algo que não é apenas uma coisa no mundo, algo que é ao mesmo tempo capaz de "conter" o mundo, de ser sua expressão, que nos permite colocá-lo diante de nós, torná-lo um objeto. A objetivação da linguagem é assim um exemplo particularmente eloquente da transcendência do homem, do fato de que o homem, em cada fase de sua vida, já ultrapassou efetivamente tudo o que é apenas um conjunto de coisas singulares.


Ver online : PATOCKA, Jan. L’écrivain, son “ objet”. Paris: Presses Pocket, 1992