O livro de M. Martin Lamm sobre Swedenborg (Valéry)

No entanto, o livro que acabo de ler propõe ao pensamento um Swedenborg completamente diverso. A ideia vaga e hoffmaniana que minha ignorância formara dele mudou-se na de uma figura não menos enigmática, mas precisa - potentemente interessante, cuja história intelectual suscita uma quantidade de problemas de primeira importância no âmbito da psicologia do conhecimento.

Li a obra de M. Martin Lamm com um apego crescente; via desenhar-se, de capítulo em capítulo, o extraordinário Romance de uma "segunda" vida - disse "romance" porque ingenuamente, durante a leitura, senti aquele desejo intenso da continuação, aquela sede do devir que geralmente só nos toma nas produções destinadas a nos fazer provar as delícias da aventura...

Indubitavelmente, a aventura de que se trata não é daquelas cujo enredo inebria e encadeia o imenso número de leitores; ela se desenrola inteiramente nos âmbitos mais reservados da vida mais interior e nas fronteiras indecisas onde se manifestam as potências, as ambições, as trevas e as luzes que estão em nós, opondo-se entre si como de resto se opõem aos fenômenos ordinários do "mundo exterior". Mas, para meu gosto particular, não existem viagens aos confins do real, relatos maravilhosos, narrativas épicas ou dramáticas que superem o estudo do inesgotável criador e transformador universal que chamamos Espírito.

O Swedenborg que o livro de M. Lamm me reapresenta é um ser que conheceu, sofreu, atravessou todos os estados ou fases de uma vida psíquica das mais intensas e completas, dado que ele parece ter percorrido a extensão intelectual desde a atividade mais normal até certos extremos que poderíamos qualificar de anormais, se esse termo que para meu pensamento tem um valor puramente negativo não apresentasse um juízo demasiado sumário e simples. A análise de suas obras sucessivas, conduzida magistralmente pelo autor, nos oferece o desenvolvimento de um caso prestigioso que cada um, segundo a natureza de seu espírito, pode utilmente meditar e interpretar; cada um pode estudá-lo, comentá-lo, admirá-lo ou arquivá-lo como lhe aprouver, seja na história, na filosofia, na psiquiatria, na mística - ou mesmo na poesia.

No entanto, qualquer que seja o uso que dele se faça, o leitor atento deste volume permanecerá necessariamente maravilhado por sua plenitude e clareza. Considerará com respeito a soma de conhecimentos, a quantidade de trabalho e o vigor intelectual pressupostos por um exame e exposição do conjunto da enorme obra de Swedenborg. Imagino que essa obra nem sempre seja de fácil acesso, embora nela se encontrem, em certos pontos, fragmentos de grande beleza poética, deliciosas visões surgidas não sei de qual infância transcendental. Contudo, ela constitui um documento incomparável, cujo interesse eu nem suspeitaria sem o esforço empreendido por M. Lamm em reduzir ao essencial uma matéria imensa e em nos servir de guia nos Infernos e Paraísos swedenborguianos. Em seu Prefácio, ele modestamente reduz seu papel ao estudo da gênese da Teosofia de Swedenborg, estudo no qual se empenhou durante suas pesquisas sobre a "corrente de misticidade sentimental que anuncia o romantismo antes de nele se confundir". Mas ele se viu, a meu ver, tendo traçado um personagem singular do grande drama do espírito humano.

Não é tudo. Um livro vale, a meus olhos, em consideração ao número e à novidade dos problemas que cria, anima ou reanima em meu pensamento. As obras que impõem ou postulam a passividade do leitor não são de meu gosto. De minhas leituras, espero que produzam em mim aquelas observações, reflexões, súbitas pausas que suspendem o olhar, iluminam perspectivas e subitamente despertam nossa profunda curiosidade, os interesses particulares de nossas pesquisas pessoais e o imediato sentimento de nossa inteira presença viva.

Assim, em poucas palavras, tentarei dar a ideia de algumas das questões nascentes que o livro de M. Lamm suscitou em mim.