A solução goethiana da questão de Fausto, solução que rejeita a venda da alma imortal como impossível, nos conduz assim a uma outra versão ainda, quase contemporânea, da mesma lenda. Faz apenas vinte e cinco anos que Thomas Mann publicou seu Doutor Fausto, que tentaremos agora confrontar, como terceira figura fundamental, às duas precedentes. Partiremos mais uma vez da situação histórica que ali se reflete.
A situação comporta mais uma vez um “império germânico”, que se apresenta, no (…)
Excertos de obras literárias, cênicas e gráficas, além de crítica literária, com foco no imaginal mitográfico, lendário e fantástico.
Matérias mais recentes
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Patocka – Fausto de Thomas Mann
3 de julho, por Murilo Cardoso de Castro -
Patocka – Fausto de Goethe
3 de julho, por Murilo Cardoso de CastroTanto no Volksbuch quanto em Marlowe, em sua primeira versão poética, a história de Fausto permanece ao mesmo tempo uma lenda explicitamente alemã, situada com precisão em um lugar do mundo e um ponto no tempo. A unidade da cristandade não existe mais. Os países das fronteiras ocidentais se libertam abertamente dos laços impostos pela autoridade e pelo poder espiritual. No entanto, mesmo na fragmentação e no caos do período da Reforma, o Sacro Império Romano permanece fundamentalmente (…)
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Patocka – venda da alma imortal? (Fausto)
3 de julho, por Murilo Cardoso de CastroOs mitos não morrem, como acreditavam os racionalistas e seus seguidores. Seria mais correto dizer que simplesmente se transformam, pois há algo mais além do conteúdo contingente do mundo e do conhecimento que possuímos sobre ele. Há o coração do mundo, elevado acima da contingência e da não-contingência no sentido comum desses termos. O coração do mundo não é apenas algo que pode ser objeto de um saber filosófico, mas algo com o qual nos relacionamos com todo o nosso ser, algo que narramos (…)
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Daniel Vouga (Baudelaire) – dandismo e desprezo
3 de julho, por Murilo Cardoso de CastroEntre outros projetos que nunca realizou, Baudelaire menciona várias vezes um artigo sobre "o dandismo literário" (cf. por exemplo Correspondance, III, p. 244); e entre os dândis, inclui Joseph de Maistre. Não especifica sob qual título. Mas basta ter lido o capítulo IX do estudo dedicado a Constantin Guys, "o pintor da vida moderna", para saber que o dandismo nunca consistiu, aos olhos de Baudelaire, em exibir um colete vermelho ou uma bengala com pomo de ouro, e que "o gosto imodesto pelo (…)
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Patocka – O escritor e seu "objeto"
3 de julho, por Murilo Cardoso de CastroO descontentamento da intelligentsia, sua nova consciência de si, suas reivindicações, seu agrupamento e solidariedade aparecem como os primeiros indícios de uma época nova da qual ainda não sabemos se trará uma superação da crise assinalada em quase todos os domínios pela impotência da razão diante do absurdo, cuja persistência a realidade presente traduz. Muitos, vendo nesses fenômenos novos apenas o que lembra a agressividade da desrazão, as paixões cegas, a "plebe" no sentido tradicional (…)
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Patocka – o mundo da vida
3 de julho, por Murilo Cardoso de CastroParece que o conceito husserliano de "mundo da vida" traz aqui uma solução. Aquilo em que vivemos originalmente não é o "mundo em si", ao qual só chegamos através de um longo e laborioso processo de eliminação progressiva de todo "antropomorfismo", mas sim o mundo da vida, cujo sentido é constantemente elaborado e enriquecido pelas funções "anônimas" da vida. Essas funções são anônimas porque, embora estejamos a todo momento em presença de seus resultados, o emissor permanece ausente. O (…)
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Patocka – o sentido da vida
3 de julho, por Murilo Cardoso de CastroPara o escritor moderno, poeta ou prosador, essa apreensão individual do sentido da vida é determinante. O que valorizamos no escritor-artista é o que ele consegue revelar do sentido da vida mediante a linguagem corrente, formada pelo uso prático cotidiano, orientada para as coisas, recorrendo também a nosso saber objetivo. Utilizar a linguagem para fins que não são seus fins habituais, para objetivos que não pretendia visar; da expressão das coisas que era, transformá-la na expressão da (…)
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Patocka – o mito e sua desagregação
3 de julho, por Murilo Cardoso de CastroDissemos que o primeiro fruto desse retorno [pela objetivação da linguagem] é o mito, a lenda, a fábula. O mito mantém a coesão de um sentido uno: "uno" porque a trama, a ação, a situação, a tarefa a cumprir devem ser conduzidas a uma conclusão que, feliz ou trágica, deve sempre representar uma resposta, resolver a questão do sentido da história narrada. É assim que se objetiva um contexto de vida, com suas referências internas, sua forma e conteúdo. Aqui se expressam as tendências mais (…)
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Patocka – linguagem e escrita
3 de julho, por Murilo Cardoso de CastroO próximo passo da dialética pela qual o homem se torna expressamente um ser vivente espiritualmente, ou seja, em uma relação explícita e consciente com o mundo, é a escrita, a fixação da expressão verbal. A necessidade de fixação é muito antiga, primordial, como se depreende da estereotipia da narração inicialmente oral, da precisão ritual com que os mitos são transmitidos, das figuras que facilitam a recitação e a memorização. Com a escrita, que transforma a fala em algo que pode ser (…)
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Patocka – linguagem e fala
3 de julho, por Murilo Cardoso de CastroA linguagem, traço distintivo do homem (nenhum animal possui linguagem no sentido de um meio de entendimento com um teor de significação), cristaliza-se originalmente a partir da fala, da atividade de falar, sendo esta inseparável de uma situação de fala. A situação de fala é o que determina o sentido do que é dito, o que localiza a significação no tempo e no espaço, relacionando-a a tais ou tais pessoas cuja presença é dada a entender pelo contexto. Na origem, a fala é parte integrante de (…)
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