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Meyrink – O Anjo da Janela do Ocidente

terça-feira 23 de julho de 2024

MeyrinkAJO

O Anjo da Janela do Ocidente é um dos últimos romances que Gustav Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) escreveu antes de morrer; o enredo é constituído por um emaranhado de temas que já estavam presentes em suas obras anteriores. Na verdade, trata-se aqui — como nas Histórias de Criadores de Ouro — da reconstituição romanceada da vida e das vicissitudes de um personagem, um alquimista que realmente existiu, e — além disso — da identificação de um ser vivo com um personagem de outro século, ou seja, de vidas que representam manifestações variadas de uma única e mesma entidade espiritual, o que é o tema de O Dominicano Branco e, em parte, também de A Noite de Walpurgis e de O Golem, do mesmo autor.


John Dee: Entre a História e a Ficção

No que diz respeito ao primeiro ponto que acabamos de indicar, o personagem histórico escolhido por Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) é John Dee (1527-1608), sábio e adepto das disciplinas herméticas, astrológicas e mágicas, que viveu na época elisabetana. Alega-se que Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) teria tido acesso a manuscritos inéditos relativos à vida de John Dee. Resta determinar, no entanto, em que medida muitos dados e detalhes indicados no romance e que não se encontram na biografia de John Dee, tal como resumida na Encyclopedia Britannica, foram simplesmente inventados pelo autor.

É assim, por exemplo, que a antiguidade da nobreza dos Dee e sua árvore genealógica (que remontaria, segundo o romance, a Roderick, o Grande, e a Hoël Dhats) ainda precisam ser demonstradas. Pelo contrário, a prisão de John Dee por práticas mágicas contra a Rainha Maria Stuart é um fato histórico, mas sua libertação teria ocorrido em decorrência da decisão do Conselho da Coroa e não graças à intervenção da Princesa Elizabeth que, na época, ainda não era rainha da Inglaterra. A história confirma, igualmente, as relações de Dee com Dudley, Laski e Edward Kelley. Este último, no romance, nos é apresentado como um curandeiro com as orelhas cortadas que alegava ter encontrado a Pedra Filosofal, e que teria se associado a Dee, desempenhando o papel de uma espécie de médium para a evocação de espíritos e entidades inferiores. Em contrapartida, parece que o nível espiritual desse personagem era mais elevado. Ele nos deixou pequenos tratados de alquimia que não são desprovidos de valor.

Outros fatos do romance também são reais: o grande renome de sábio que Dee adquiriu tanto na Inglaterra quanto em outros países europeus; suas numerosas viagens, incluindo a realizada em 1548, quando teve que fugir da Inglaterra, tanto por ser suspeito de envolvimento em complôs políticos quanto pelo escândalo ligado à encenação de A Paz de Aristófanes; o incêndio do castelo de Mortlake; a disputa entre Dee e Kelley; finalmente, a morte de Dee, ocorrida em Mortlake, na miséria e na mais completa penúria, em dezembro de 1608.

A história confirma a missão que Dee recebeu de examinar os direitos da Coroa inglesa sobre terras descobertas na época, bem como as pesquisas geográficas que esse exame comportava. A Biblioteca Cottonian ainda conserva dois dossiês originais cujo conteúdo não deve ser alheio ao tema da "Groenlândia", utilizado por Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) de forma sugestiva. Finalmente, o Museu Britânico possui uma bola de cristal do tamanho de uma laranja, que se sabe ter sido utilizada por Dee como espelho mágico.

O romance, no entanto, não menciona que, em seu retorno da Boêmia, Dee obteve, em 1595, o cargo de reitor do Manchester College. Além disso, sabe-se menos sobre suas relações com o imperador Rodolfo do que sobre aquelas que ele mantinha com Maximiliano II, a quem dedicou, em 1564, um interessante tratado hermético intitulado A Mônada Hieroglífica [1].


O Eu Transcendente e a Realização Espiritual

Quanto à própria trama do romance, trama que se apoia nesses fatos históricos, ela não se baseia, como se poderia crer, em quimeras reencarnacionistas. Trata-se, ao contrário, da teoria muito mais séria, segundo a qual todo ser humano, longe de representar um "Eu" próprio cuja existência começa com o nascimento e termina com a morte, seria antes a manifestação de uma entidade — de um deus ou de um demônio — anterior e superior à sua vida terrestre limitada.

Em determinado momento, certas "linhagens" veem formar-se nelas uma "causa", ou, em outras palavras, enxertar-se uma influência transcendente que, para além do tempo e dos séculos, forma as condições necessárias para a continuidade de um destino e de uma ação visando à realização espiritual através de várias gerações.

Nesses casos, o sangue pode desempenhar o papel de um suporte apropriado e na mesma linhagem podem aparecer indivíduos que, na realidade, são um único e mesmo ser que retorna — como as ondas que, uma após a outra, investem contra um obstáculo — até que o ciclo se feche com o nascimento mágico de um ser que é "um ressuscitado neste mundo como no outro", e um "Vivo" no sentido iniciático desse termo. Talvez não seja inútil notar aqui que diversos aspectos dos cultos das famílias nobres (gentes) difundidos no mundo tradicional, tanto oriental quanto ocidental — Hellade e Roma inclusive — não são estranhos a essa concepção, que faz parte de um ensinamento esotérico no qual Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) se inspirou em vários de seus romances. Em O Anjo da Janela do Ocidente, o Barão Müller, o último descendente dos Dee de Gladhill, é o próprio John Dee que se recorda de si mesmo: e é ao Barão Müller que será dado o sucesso na empreitada em que tanto John Dee quanto outra manifestação sua na linhagem do mesmo sangue — John Roger — falharam. Ao redor do Barão Müller evoluem, além disso, como figuras dos tempos modernos, e em situações análogas, os mesmos personagens e os mesmos poderes com os quais ele já lidou alguns séculos antes.


A Doutrina do Andrógino Espiritual e a Transmutação

Para indicar a realização em questão, Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) retoma a doutrina do andrógino espiritual que, no esoterismo ocidental, parece ter se ligado também ao misterioso símbolo templário do Baphomet e, sobretudo, ao símbolo hermético e alquímico do Rebis (= res bina: natureza dupla). Seu equivalente extremo-oriental é a unidade ativa do Yang e do Yin, do masculino e do feminino em uma só natureza; no tantrismo, é a conjunção de Shiva e Shakti. Este motivo central aparece, aliás, também em outros livros de Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) .

A esse respeito, os hermetistas e os Rosa-cruzes também falaram do mysterium conjunctionis, das "Núpcias Químicas", da união do adepto com a "Dama dos Filósofos" ou a "Rainha" na "terra além-mar", o que teria como efeito a posse da dupla coroa e do duplo poder. Segundo o romance, o fato de ter tomado os símbolos desse gênero em seu sentido literal constitui precisamente o erro fatal de todo o primeiro período da vida de John Dee. A "Rainha", que este último acreditou poder possuir pela força de encantamento na pessoa de Elizabeth, é na realidade a "Mulher interior", ou transcendente, da qual toda mulher mortal é apenas uma máscara e uma manifestação contingente; é "nossa Eva oculta", a "Diana nua", a força-vida da qual o homem permaneceu desapegado desde que decaiu do estado primordial. Assim, o mysterium conjunctionis é também o mistério da reintegração iniciática, em um aspecto particular desta, e seu efeito é a dignidade real, no sentido esotérico. Em outro romance, Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) empregou, para a mesma realização, o simbolismo da espada a ser ressoldada, que vem da literatura cavalheiresca.

As "Núpcias Químicas" têm, é evidente, um significado operativo e podem também remeter a uma técnica especial de magia sexual que diferentes tradições conheceram. O impulso para a superação da fratura existencial, para a experiência da unidade absoluta do ser, já age, de forma obscura e cega, em cada união sexual do homem e da mulher (ver, em Platão, o mito do andrógino como chave do sentido último de todo eros). Mas na vida erótica vulgar esse impulso é neutralizado e desviado, tornando-se instrumento da geração animal ou de uma volúpia ilusória.

Aquele que aspira ao Adeptado e escolhe a via do sexo, deverá ser capaz de conservar e "fixar" a força da virilidade que geralmente sofre o feitiço carnal da mulher, e de se unir a ela, à "nossa Eva oculta". Isaís, a Negra, personifica em Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) a força telúrica que tende a contrariar a realização dessas "Núpcias Químicas", a captar o elemento ativo masculino de forma que ele sucumba "à morte sugadora que vem da mulher" (assim se expressa Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) ). E o autor indica muito justamente a relação que essa força telúrica tem também com o sangue: Isaís é a soberana oculta nascida no sangue.


Técnicas Iniciáticas e a Crítica à Magia Ceremonial

No que diz respeito às técnicas tradicionais, Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) nomeia, entre outras, o vajroli-tantra; mas, em relação a esta, seus conhecimentos deveriam ser deficientes e superficiais. Tivemos em outro lugar [2] a oportunidade de expor de maneira completa esses ensinamentos. Postas de lado algumas desviações sempre possíveis, no tantrismo não se trata nem de uma "magia negra" nem de práticas "horríveis" ou "obscenas", segundo o julgamento de certos personagens do romance (Lipotine e Gardener). Se, em determinado momento, o ser no qual John Dee desperta novamente acredita que a essência da operação consiste em incorporar em si a "mulher" para "redimi-la" (isto é, para fazê-la mudar de polaridade), por meio de uma vontade que deve ser tornada firme e segura graças a certas disciplinas, isso corresponde em todos os pontos ao ensinamento tântrico relativo à via mágica do sexo. Contudo, no romance, tudo se reduz a uma simples alusão, assim como a via dita da "vigília iniciática" é apenas esboçada. Logo após essas alusões, a narrativa passa à descrição de episódios totalmente fantásticos. Além disso, o autor encontra a ocasião de declarar que práticas desse tipo só podem ser realizadas em sua totalidade por orientais, o que é muito duvidoso. Assim, justamente para destruí-lo, o vajroli-tantra teria sido revelado ao protagonista do romance pelos emissários das forças adversas.

A via escolhida pelo herói do romance, depois que ele tentou em vão os métodos tântricos, não é, portanto, muito clara. Parece que o "encanto das bolas vermelhas" seja uma experiência ligada à técnica de uma asfixia parcial: fumaças ou vapores tóxicos devem ser aspirados pelo neófito na presença de um mestre que se presume ajudá-lo a vencer a crise, e a se manter consciente, "de pé", através da mudança de estado que se segue. Superar essa prova significaria assegurar a "virilidade transcendente" ou iniciática, simbolizada pela lança de Hoël Dhats. Numa ordem de ideias semelhante, parece, entra a prova dita do "Poço de São Patrício", forma cristianizada de antigos ensinamentos iniciáticos que depois se degradaram em forma de um simples folclore.

No fundo do "Poço de São Patrício" queima um fogo com duplo poder: o de destruir e o de purificar; aquele que desce lá saberá em que medida será capaz de vencer a "segunda morte". Mal precisamos notar que temas semelhantes se encontram no ciclo do Graal, com a prova do "Poço de São Patrício" e do suposto "assento perigoso" que se transforma em um abismo para aqueles que nele se sentam sem serem eleitos e onde a lança aparece frequentemente com o mesmo significado que explicamos acima [3]. Quanto às técnicas iniciáticas do tipo das fumaças tóxicas, empregadas para atravessar as "águas" e — acrescentamos — para adquirir a força necessária para realizar sem perigo (o perigo, entre outros, da obsessão descrita de forma tão sugestiva por Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) ) as "Núpcias Químicas", elas são semelhantes às operações que os hermetistas chamam de "águas corrosivas".

O romance menciona o uso do espelho mágico para "ver" ou "comandar". Contudo, para não ser apenas o brinquedo de sua própria imaginação e para não terminar em uma mediunidade passiva, é necessário que o operador tenha superado provas do gênero das fumaças tóxicas e que esteja em estado de poder "sair", ou seja, de se desligar de maneira ativa da consciência das condições corporais. Não se deve ter ilusões quanto ao alcance de certos processos mágicos, muito simples na aparência.

Um dos principais personagens do romance é Bartlett Green, que o autor relaciona com certas formas arcaicas da iniciação escocesa e com o culto de Isaís, a divindade feminina que, posteriormente, se revelará ser a Isis, tal como foi, na antiguidade, adorada em certos meios da região do Ponto. Aqui, o elemento romanesco provoca, no entanto, uma confusão. De fato, na primeira parte do livro, Bartlett Green é apresentado sob os traços de um homem que chegou (por vias obscuras e graças a ritos horríveis, é verdade) a possuir "a mulher interior" e a se tornar assim um "Príncipe da Pedra Negra", o que tem por efeito torná-lo totalmente inacessível à dor e ao medo. Por outro lado, na segunda parte, ele será representado apenas como um emissário das forças demoníacas, como o agente da "contra-iniciação" (para usar esse termo guénoniano), que tenta por todos os meios seduzir John Dee.


Simbolismo Geográfico e a Busca do Eu

Ao tratar do culto de Isis pôntica, Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) alude a uma iniciação ao ódio — iniciação pouco conhecida — e a certas experiências baseadas no prazer erótico exacerbado por um ódio desmedido entre duas individualidades de sexo diferente. Mas, a esse respeito também, as coisas não são claras. De fato, não se vê bem como o sacrifício do elemento masculino (sacrifício indicado como sendo a própria essência da iniciação própria à Isis pôntica ou Isaís, a Negra, como é chamada no romance) poderia resultar das experiências do tipo mencionado acima. Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) poderia ter fornecido uma base mais sólida e mais sugestiva para essa parte de seu romance. Ele poderia muito bem ter relatado a antítese entre a verdadeira vocação de John Dee e as influências que buscam desviá-lo e privá-lo da "lança mágica", à oposição que existe entre os cultos "olímpicos" masculinos e os cultos "telúricos" ou lunares ligados justamente a deusas soberanas. Um traço típico destes últimos, particularmente visível nos mistérios de Cibele, é constituído pelos êxtases turvos, provocados por meios violentos, orgiásticos e frenéticos, êxtases que são equivalentes a uma espécie de castração espiritual; é justamente isso que, em seu romance, o autor atribui, mais ou menos, à iniciação de Isaís.

Considerando essas ponderações, Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) também poderia ter usado de forma mais eficaz o tema da "Groenlândia" e o da "Inglaterra". De fato, segundo a Tradição, a origem das iniciações masculinas é boreal. Por isso, a "Groenlândia", nome cujo sentido literal é: "Terra Verde", aparece por si mesma — e com ela outras regiões do Norte — como uma terra mística e simbólica. Pode-se afirmar o mesmo, em alguns casos, da própria Inglaterra que, como "Albion" e "Terra Branca", também teve um significado simbólico, daí a possibilidade de um jogo de palavras com "Engelland", que pode significar Inglaterra e, ao mesmo tempo, "Terra dos Anjos".

Em um dos episódios do romance, a direção do setentrião parece ser a direção justa que faz com que tudo o que, em um dado meio e em uma existência, se acreditava regulado e em ordem, apareça oblíquo, deslocado e desprovido de sentido. Assim, esperar-se-ia que Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) tivesse querido introduzir em seu romance o significado místico da Groenlândia e desenvolver de forma mais precisa a antítese que existe entre a iniciação — diremos "boreal" — para a qual John Dee, o "senhor da lança", tende inconscientemente e o mundo espiritual onde a deusa é soberana, como o era nos mistérios antigos aos quais fizemos alusão. Mas isso não foi feito.

Além disso, o papel que Jane-Jeanne desempenha no romance está longe de ser claro. Sobretudo John Dee, tal como reaparece na "encarnação" do Barão Muller, não mostra precisamente os traços viris de um iniciado, em sua ligação com Jane. Pelo contrário, esta última desce a um nível puramente humano e quase sentimental. O significado do sacrifício de Jane não é, por si só, claro.


A Desilusão de John Dee e a Verdade do "Eu"

Ao longo de sua primeira existência, John Dee foi decepcionado de várias maneiras. Para começar, ele caiu — como foi dito — no erro que o levou a interpretar em um sentido material o simbolismo hermético da "Rainha", das "Núpcias" e da conquista da "Groenlândia". Tendo, em um período subsequente de sua vida, reconhecido esses erros, John Dee dedicou-se à alquimia hermética, ou seja, àquela que não se esgota na transmutação metálica, mas procede da "via de Elias". Essa via — a do profeta que não deixou seu corpo na terra e que nunca teria morrido — é a via mágica da alquimização do corpo e da alma, que se supõe assegurar a ambos a invulnerabilidade na condição humana e em qualquer outro estado de existência. No entanto, mesmo nesse domínio, John Dee se deixa desviar. Ele não escuta Gardener que lhe lembra que aquele que busca compor a "Pedra da Imortalidade" por meios tão físicos, se não tiver passado antes pelo processo oculto do renascimento espiritual, nunca estará garantido contra as armadilhas das forças sombrias do outro mundo. Ele imaginará poder descobrir o segredo da "via de Elias" graças às revelações de um Anjo evocado em sessões semimágicas e semimediúnicas organizadas por Kelley. Esse Anjo é o Anjo da Janela do Ocidente que se revelará, no final, uma criatura de mentira e enganará miseravelmente John Dee.

Desse ponto de vista, o romance contém um ensinamento real, ao denunciar o erro tanto da mediunidade quanto de um certo tipo de magia cerimonial. Quanto à primeira, o autor, aludindo às práticas espíritas, diz que Kelley, o médium culpado dos desvios de John Dee, tornou-se, em nossa época, um verdadeiro câncer de mil faces. Quanto à magia cerimonial, o ensinamento superior, revelado por Gardener, afirma que entidades como o Anjo Verde são apenas formas ilusórias, nas quais se cristalizam e se personificam os desejos, os conhecimentos e os poderes que o homem oculta em si sem mesmo o suspeitar; é por isso que, ao seguir as vias indiretas desse tipo de magia, ele acredita ter obtido revelações maravilhosas.

Somente após ter sofrido muitas desilusões, John Dee finalmente reconhecerá que o verdadeiro apoio, o ser que nunca o abandonará, é o Eu, o princípio transcendente, central e luminoso da personalidade. E essa é a premissa do verdadeiro caminho iniciático, muitas vezes chamado de "a via direta".


Simbolismo do Ocidente e o Centro do Mundo

Uma precisão é útil no que diz respeito ao simbolismo do Ocidente e da "Terra Verde" que não tem apenas o significado realçado neste romance. Se se concebe o Oriente como a terra de onde vem a luz, o Ocidente aparece então como a região do poente e, por analogia, como a da morte e das forças da morte. Mas os antigos também conheciam outras relações de analogia: onde morre a luz física, ali nasce a luz espiritual. E é por isso que nos ensinamentos iniciáticos se encontra igualmente um "Ocidente sagrado" que possui o valor positivo de uma terra de imortalidade ou "Terra dos Vivos". A "Terra Verde" da antiga tradição egípcia, a misteriosa região ocidental de Amitaba das tradições extremo-orientais e o jardim das Hespérides dos gregos antigos não tinham um sentido diferente.

No final do romance, onde o autor utiliza certos símbolos dos Rosa-Cruzes (por exemplo, os da rosa e da arte da jardinagem), ele fala também de um centro supremo do mundo (Elsbeth-stein), ideia análoga à da Agartha, da tradição indo-tibetana, sede de uma Ordem que controla invisivelmente os destinos dos homens. Os membros dessa Ordem são apresentados como seres "liberados", que permaneceram na terra para "transformar": o simbolismo alquímico da transmutação dos metais é, portanto, retomado aqui e aplicado a um plano superior. No que diz respeito à responsabilidade ligada aos seus poderes, é dito no romance que eles devem sempre se lembrar que aquilo que será feito por eles, os homens atribuirão à sua Deus. Quanto ao tema de um semelhante Centro ou Ordem invisível, não é uma invenção de Meyrink Meyrink Meyrink, Gustav (1868-1932) ; ele aparece, sob formas variadas, nas tradições e nos ensinamentos esotéricos de todos os povos [4].

Essas poucas notas poderão ser úteis aos leitores que desejam separar o que, neste livro, é fabulação do que está ligado a um ensinamento tradicional autêntico.

JULIUS EVOLA Evola Giulio Cesare Andrea "Julius" Evola (1898-1974) .


[1Esta pequena obra foi traduzida do latim para o francês por Grillot de Givry (Paris, 1925). É interessante notar que o símbolo essencial de que se trata neste livro é encontrado em uma obra hermética italiana de C. Della Riviera (Il mondo magico de gli Heroi, Milão, 1605), dedicada a um príncipe da Casa de Saboia.

[2J. Evola, Metafísica do Sexo, Payot, Paris, 1959.

[3Examinamos todos esses temas em nosso livro: Il Mistero del Graal e la tradizione ghibellina dell’impero, Bari, 1937.

[4Sobre este assunto, ver R. Guénon, O Rei do Mundo, Paris, 1939.