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A Busca do Absoluto de Balzac (Abellio)
sábado 3 de maio de 2025
Conhecemos a célebre frase de Baudelaire Baudelaire Charles Baudelaire (1821-1867) : "Muitas vezes me surpreendi que a grande glória de Balzac Balzac Honoré de Balzac (1799-1850) fosse passar por um observador; sempre me pareceu que seu principal mérito era ser um visionário, e um visionário apaixonado." Eis, sem dúvida, a principal mola da leitura de Balzac Balzac Honoré de Balzac (1799-1850) : a acumulação de descrições, de detalhes precisos e bem observados e até mesmo de partes didáticas se tornaria fastidiosa se não fosse sustentada e arrebatada por uma transfiguração geral, uma visão propriamente mitológica ou "surreal", que participa ao mesmo tempo da transposição pictórica e da tensão profética. Ninguém pode se dizer balzaquiano se não entrar nesse jogo e aceitar a simplicidade, o entusiasmo, a ingenuidade, a grandeza desse profetismo, a minúcia, a habilidade e, quando necessário, a astúcia, a artificialidade dessa transposição. A Busca do Absoluto é, a esse respeito, o melhor campo de experiência possível, mas é verdade que é um dos romances mais depurados, mais bem compostos, mais equilibrados de Balzac Balzac Honoré de Balzac (1799-1850) . Um rico flamengo se apaixona pela química e pela alquimia e quer descobrir o segredo do Absoluto, ou seja, a unidade da matéria. Esse gênio sombrio arruína sua família. Sua esposa e filha resistem a ele, menos para salvar seus bens do que por um certo amor angélico que nutrem por ele. Nenhum detalhe nos é poupado na descrição dessa mansão patrícia de Douai, que se esvazia pouco a pouco de seus móveis, prataria, quadros, assim como todo o concreto prosaico de um pequeno mundo provincial e doméstico, tão fielmente registrado quanto as escrituras notariais que atestam sua ruína. No entanto, nada que não esteja em seu lugar, no momento certo, no movimento trágico que arrasta os três heróis, nada que no final não se ajuste e se ilumine, depois desapareça e se funda nesse canto profundo em glória à ciência e ao amor, que sublima e engrandece as coisas dispersas, os instantes desconexos, todo o acidental. E mesmo, terminada a leitura, ocorre um curioso retorno dialético: é justamente a acumulação de detalhes concretos, percebemos então, que nos permitiu acreditar, ao longo do caminho, nessa história inacreditável. Tais são os meandros da eficácia romanesca, as artimanhas do gênio.
Não deixa de ser interessante notar que o próprio Balzac Balzac Honoré de Balzac (1799-1850) hesitou entre os dois aspectos, um realista, outro profético, desta obra, pois a incluiu inicialmente, na edição de 1834, nas Cenas da Vida Privada, enquanto a partir de 1845 a colocou na seção chamada Estudos Filosóficos. Para ser franco, essa classificação permanece artificial, a obra justapondo vários temas, e, sob outros aspectos que nos parecem essenciais, poderíamos igualmente ver hoje todos os traços de um conto de fadas ou de uma obra de ficção científica, sem nenhum espírito pejorativo, ao contrário, mas para mostrar ainda melhor o tipo de adesão que essa leitura exige e a frescura de alma que é preciso trazer. Tentemos precisar esses pontos.
É claro que, em nosso espírito, o romance de ficção científica é apenas a forma moderna e tecnológica do conto de fadas, e a distância entre eles é sobretudo a de duas linguagens distintas mas igualmente convencionais, articuladas em todo caso sobre o mesmo universo mítico e superpovoado. Não pretendemos renovar aqui a crítica balzaquiana destacando que A Busca do Absoluto mistura esses dois gêneros ou faz a transição entre eles, mas talvez não se possa situar melhor essa obra em sua época (e mesmo toda a obra de Balzac Balzac Honoré de Balzac (1799-1850) ) do que estudando nela essa confluência de um arcaísmo e um futurismo bastante intemperantes um e outro para serem excitantes. Conto de fadas, em primeiro lugar, pelo constante angelismo dos sentimentos da esposa e da filha desse doutor Fausto, a idealização dos casamentos burgueses que nos são descritos e também essa mistura muito romântica de feiura física e encanto moral em Josefina, cujo corpo é deformado mas a alma transparente e o coração ardente, e que consegue parecer bela. Conto de fadas ainda por esses êxitos milagrosos que reavivam o ardor do alquimista: uma experiência estéril sobre a cristalização do carbono é abandonada e deixada sem vigilância durante anos, e, ao retornar, Balthazar Claës descobre em sua cápsula um diamante puro. Conto de fadas, enfim, por essa recuperação final e quase instantânea das fortunas, para reconhecer e recompensar a virtude e pela aplicação das leis do mundo feérico que querem que a virtude enfrente todas as desgraças, evite todas as armadilhas e seja finalmente recompensada. Mas, ao mesmo tempo, ficção científica, por uma imersão nos abismos da química militante, ainda não triunfante é verdade, mas quase, ébria de si mesma, pela qual tudo já é possível, e onde se fala em "decompor o nitrogênio" e chegar imediatamente ao princípio de toda matéria, por uma intuição, uma iluminação certa que vai revelar todo o panorama das transmutações.
Haveria evidentemente muito a dizer sobre o imperturbável espírito de seriedade que anima Balzac Balzac Honoré de Balzac (1799-1850) nessa empreitada. É que ele nos conta ao mesmo tempo uma tragédia e uma epopeia e acredita nisso: as diversas vocações de seus heróis e seus poderes são levados a um paroxismo que não se acomoda nem da dúvida nem do humor. Certamente, ao estudar essa Busca do Absoluto, os críticos notaram unanimemente que o escritor evitava tomar partido e mantinha a balança equilibrada entre os dois campos opostos do amor e da ciência. As duas mulheres defendem a ordem familiar e sentimental, o alquimista a destrói em nome de outra ordem, e essas duas ambições são igualmente estimáveis. Esses mesmos críticos também observaram que, ao fazer isso, Balzac Balzac Honoré de Balzac (1799-1850) era no fundo fiel a si mesmo: professando em matéria de doutrina social as ideias mais conservadoras, mais respeitosas da ordem estabelecida, não deixa de ser fascinado, como romancista, pelos heróis mais aventureiros, mais rebeldes, mais propensos ao desafio. Mas, aqui, isso é pouco dizer. Outra questão se coloca. Essa adesão que Balzac Balzac Honoré de Balzac (1799-1850) dá indiferentemente aos sentimentos e crenças que descreve é acompanhada de sua valorização intrínseca, unilateral. Ele os transforma em valores absolutos, incontestáveis, ignorando até a possibilidade de valores contrários. Passa-se bem pela utopia científica, pois na época tudo se abria à ciência, e ainda se podia confiar, sem muito devaneio intelectual, na vocação ou nas divagações de tal ou tal amador ilustre mobiliando seu sótão com alambiques ou pilhas de Volta. Mas sua projeção idealizada e otimista de um estatuto conjugal e social que tudo, na época, já anunciava como ultrapassado, coloca outros problemas. A psicologia moderna reconheceu que o amor, mesmo apenas conjugal ou filial, esconde seu próprio inimigo, vê sempre se abrir nele alguma fissura secreta, não cessa de explorar e intensificar uma ambivalência, uma ambiguidade fundamentais. Nossas duas heroínas ignoram isso. Seu amor não está dividido contra si mesmo. Além de pertencer, socialmente, aos seus olhos, às instituições eternas, ele é para elas global, homogêneo, transparente a si mesmo, não nutre em si nenhuma contradição. É um absoluto sem clivagem e sem mistério, e, se encontra inimigos, é fora de si, num mundo hostil ao sentimento. Psicologia convencional? Não, repitamos, psicologia de conto de fadas, obedecendo aqui ainda à lei do gênero, que não cessa de fazer agir mecanismos externos (outros diriam mágicos) em virtude dos quais tudo é questão de enigma, não de mistério. Essa distinção é fundamental. O enigma se ergue diante do ser e fora dele, o mistério gravita nele. O enfrentamento do mistério ocorre na intimidade, na interioridade da consciência, é mesmo produto da abertura interna do ser. No caso do enigma, é ao contrário contra o mundo que se luta, não contra si mesmo. Contra o mundo ou contra os outros considerados como pertencentes ao mundo, em plena exterioridade. Balthazar Claës, como homem de ciência, é um estranho para sua esposa, um enigma, não um mistério. Ele não é mais a alma de sua alma, nem a carne de sua carne. Ela o vê de fora, não de dentro. Daí que tais heróis balzaquianos sejam tão facilmente projetáveis no cinema, onde todos os mecanismos da psicologia devem ser visíveis, ao contrário de outros heróis mais secretamente dilacerados. Para tentar reconquistar seu marido, Josefina começa a estudar grossos livros de química. Chamo isso de mecanismo externo. Como o amor e a química seriam do mesmo nível, em si mesmos e para o ser? Esse conjunto de constatações coloca o problema do que se chama universo balzaquiano, movido por valores morais e sociais mais do que por valores metafísicos. Resta, no entanto, a incrível intensidade desse universo. Esses mecanismos são externos, mas estão tensionados ao extremo. Dir-se-ia que Balzac Balzac Honoré de Balzac (1799-1850) só simplificou sua psicologia para tornar mais eficazes suas manifestações sociais. Poder-se-á discutir este ou aquele ponto, mas a matéria romanesca é aqui levada a tal grau de pureza e intensidade que só conta a magia do conjunto, essa visão projetiva, extremista e de certo modo ideal que, no mundo real, faz nascer outro mundo. Assim, não se lerá A Busca do Absoluto como um documento de época, mais ou menos descritivo, mas como uma evocação simbólica de certos cumes e certos abismos, fora do tempo. Então funcionará a transposição, a transfiguração, ou seja, um deslocamento, um desenraizamento onde as articulações e as leis não são mais as da realidade, mas as do que é preciso chamar de magia. Nesse clima onde tudo se torna metafórico, portanto poético, pouco importam as anotações, aqui e ali dispersas, onde os espíritos meticulosos veem o produto de uma ciência ou doutrina duvidosas. Que Balzac Balzac Honoré de Balzac (1799-1850) , em sua supervalorização da pureza, coloque sempre os anjos acima dos homens, é certamente de uma teologia simplista, mas esse início do século XIX, como se sabe, era pouco teólogo e ainda não havia medido o alcance da palavra do Apóstolo segundo a qual são os homens, no final, que julgarão os anjos. Quanto à utopia científica, também se evitará julgá-la mal, mesmo se Balzac Balzac Honoré de Balzac (1799-1850) parece conhecer menos bem a química do que as leis sobre sucessões e bens de menores, sobre as quais seus notários são imbatíveis. Sua ciência é uma mistura sincrética de química recente segundo Lavoisier, de alquimia tradicional e de espiritualismo martinista e swedenborguiano. Suporta-se mal hoje ouvir que o amor ou o sentimento é "matéria etérea que se desprende", assim como não se acredita possível "decompor o nitrogênio" com um fogão de cozinha. Cuidemos, no entanto, que tais afirmações sobre a unidade da matéria soam bastante modernas, ou que as intuições de Swedenborg sobre a realidade do mundo invisível são hoje confirmadas por experiências positivas, sem contar que não é proibido esperar um próximo renascimento da medicina espagírica. Retomados em linguagem moderna, todos esses temas do Balzac Balzac Honoré de Balzac (1799-1850) filósofo são menos desatualizados do que se pensa.
Eis, portanto, este romance onde Balzac Balzac Honoré de Balzac (1799-1850) se revela em toda a sua plenitude, tanto como mestre dos estudos de costumes quanto como visionário de uma ciência e de uma humanidade ideais. Todos os seus temas habituais estão presentes, assim como todos os seus modos de composição. Podemos ver, por exemplo, a sua teoria das correspondências, que lhe permite cimentar os detalhes das suas descrições. Nada mais magistral a este respeito do que estas páginas sumptuosas em que ele conta a história da família de Balthazar Claës, no início do romance, situando-a no seu território e nas suas mansões. Pela precisão e escolha dos detalhes, pela franqueza das cores, pela simplicidade refinada do traço, estamos em plena arte flamenga, no auge de um sucesso do qual Balthazar Claës é então o produto mais puro. Nada mais dramático também do que certas cenas em que sua arte de precipitar os acontecimentos e condensar repentinamente o diálogo leva o gênio do romancista ao mesmo paroxismo que o caráter de seus heróis ou as situações em que se encontram. Há aí uma concordância absoluta entre o poder de concepção do escritor e seu poder de realização ou evocação. Desejamos ao leitor de hoje que esqueça as complicações e as fadigas da alma moderna e se deixe pelo menos levar, se não arrebatar, por essa força.

