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William Blake, manichéen et visionnaire

Pierre Boutang – Blake, a linguagem e a dissimulação

terça-feira 8 de julho de 2025

O livro que aqui está acabou por se construir sobre uma hipótese complexa, na verdade tripla, mas em que cada componente repercute sobre as outras duas: Blake, poeta, definiu-se como "mestre das estruturas da linguagem"; só pôde manter essa pretensão delirante e metódica — onde se curva e se aprofunda seu gênio — porque era também, muito conscientemente, um mestre da dissimulação; o conteúdo dessa dissimulação encontra-se por inteiro, e simultaneamente, em sua vida e no dogma que sustentava ou preenchia sua palavra profética, das estruturas da linguagem e do verbo com as quais ele as identificava. Esse dogma, tão enorme, tão incômodo para o leitor desprevenido de qualquer um dos grandes poemas, não deveria ser uma coisa ou outra: uma invenção pessoal genial — ainda que através do caos irredutível de sua origem — e que só faz sentido no choque imprevisível de cada um dos cantos? Ou, como sugere Gaston Bachelard, o voo de uma imaginação absoluta, rebelde a todo pensamento, mesmo profético? A ideia seria consoladora para a pesquisa francesa — tradução e crítica — e justificaria sua capitulação já secular diante da obscuridade e até do mistério do poeta de Jerusalém — essa Jerusalém que permaneceu, felizmente sem dúvida, a salvo em sua língua original, e Vala apenas começou a ter um destino diferente. Se não se trata senão do onirismo poderoso evocado pelo autor de O ar e os sonhos, ou ainda (apesar da exclusão de todo pensamento) "de interjeições que pensam", quando não de uma ornitopsicologia (sic), só resta entregar-se ao furacão. Não se correrá grande risco, pois o bom filósofo dos Elementos dispunha apenas de um pequeno quinto da obra profética, através da tradução abortada de Pierre Berger nos anos vinte. Por outro lado, a tentativa prodigiosa — sem dúvida quase maníaca — de Ellis e Yeats, de interpretar a mitologia blakeana, já em 1893, foi quase por toda parte vítima da conspiração do silêncio, apesar da reedição americana em 1973 dos três volumes extraordinários.

A outra possibilidade, então? Não em relação à dogmática de Blake, em si mesma — seremos obrigados a enfrentá-la de frente, para outras surpresas além daquelas de Yeats e Ellis, mas depois... Antes, para a situação dessa dogmática no empreendimento propriamente poético; este impõe a análise da imaginação de Blake, de seu conteúdo ideal efetivo, ao menos para a compatibilidade das imagens entre si: sem isso, o mito nem começaria, haveria apenas divagação (ainda que entre a terra e o ar, como sonha o bom Bachelard)...

Nessa tarefa, percebe-se logo que a suposta obscuridade — nada menos, mais uma vez, do que reabrir as portas do Paraíso — não se deve de modo algum à complexidade e variedade das séries, mas à repetição e saturação dos temas, primeiro verbais; isso, por mais acidental que seja seu estudo, Bachelard pressentiu com "os poemas que atam nas próprias palavras a matéria imaginária e a forma dos fantasmas": dir-se-á que há sempre sobrecarga e entulho verbal logo que o metro se alonga? Mas este, de repente, se alivia e se lança, desconcertando ainda mais. É que a palavra justa não é sobrecarga; muito conscientemente, trata-se de uma carga, como de cavalaria, e de ataques acompanhados de gritos de guerra, como os slogans escoceses. A guerra — uma guerra imortal que nunca envelhece — a de Platão, é a primeira e a última palavra de Blake, sobretudo quando fala de paz; daí a forma maior de sua retórica guerreira, mais que no herói homérico: no wrath (1) inapaziguável (uma de suas palavras-chave), a provocação repetida.


BOUTANG, Pierre. William Blake, manichéen et visionnaire. Paris: La Différence, 1990