Como o mundo, a Ética aparece a cada um segundo seu grau de ser, de modo diferente. Cada vez que me aprofundei nesse edifício, a planta me parecia mais vasta, a cor renovada, o sentido mais único e mais profundo.
Mas, incapaz de dizer tudo de uma vez, já proferi dois absurdos: “grau de ser” e “mais único”. É suficiente dizer que a ideia que tenho de Espinosa, ou de qualquer outra coisa, nunca é definitiva para mim. É uma ideia conforme à minha medida.
O Ser e o Uno, sem graus, sem mais (…)
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Ditados
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René Daumal – Não-dualismo de Espinosa (1)
1º de julho, por Murilo Cardoso de Castro -
René Daumal – Diálogo laborioso sobre o poder das palavras (5)
1º de julho, por Murilo Cardoso de CastroTotochabo dizia:
— ... O mais cretino dos virtuosos, depois de alguns anos de exercício, consegue quebrar uma taça de cristal à distância, pela simples emissão da nota exata correspondente ao equilíbrio instável da matéria vítrea. Citam-se vários violinistas, não mais idiotas que outros, que faziam isso quase naturalmente. A dona da casa fica sempre muito orgulhosa de ter sacrificado à Arte, ou à Ciência, conforme o caso, a mais bela peça de sua cristaleira, uma lembrança de família, ainda (…) -
René Daumal – Diálogo laborioso sobre o poder das palavras (4)
1º de julho, por Murilo Cardoso de CastroTendo o Araucaniano bebido, fez-se um grande silêncio. Então uma velha senhora gritou secamente:
— Nada de truques de mágica aqui! Queremos explicações. Quem quebrou o violão? E como? E por quê?
— Nada de truques científicos — gritou Otelo com sua voz metálica, espuma nos lábios. Nada de truques científicos, hein? Mas explicações mágicas!
— Bebamos primeiro — pronunciou lentamente o homem por trás dos feixes de lenha. Depois, farei todos adormecerem com um discurso mais ou menos (…) -
René Daumal – Diálogo laborioso sobre o poder das palavras (3)
1º de julho, por Murilo Cardoso de CastroNum certo momento, o mau humor atingiu seu ápice e creio lembrar que alguns de nós combinamos, com ferramentas imprecisas, bater nos valentões que roncavam nos cantos. Passou-se um tempo interminável, após o qual os valentões voltaram, carregando barris sobre suas equimoses. Quando os barris foram esvaziados, pôde-se finalmente sentar sobre eles, ou ao lado, mas enfim estávamos sentados, prontos para beber e ouvir, pois havia sido mencionado torneios oratórios ou algum divertimento desse (…)
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René Daumal – Diálogo laborioso sobre o poder das palavras (2)
1º de julho, por Murilo Cardoso de CastroEstávamos em uma fumaça espessa. A chaminé não puxava bem, o fogo de lenha verde demais se retraía, as velas liberavam um vapor rançoso no ar, e as nuvens de tabaco formavam bancos azulados à altura dos rostos. Se éramos dez ou mil, já não sabíamos. O certo é que estávamos sós. A propósito, a grande voz detrás dos feixes de lenha, como a chamávamos em nossa linguagem de sedentos, tinha-se elevado um pouco. De fato, ela saía de trás de um monte de feixes de lenha, ou de caixas de biscoito — (…)
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René Daumal – Diálogo laborioso sobre o poder das palavras (1)
1º de julho, por Murilo Cardoso de CastroEra tarde quando bebemos. Todos pensávamos que já era mais do que hora de começar. Do que havia antes, ninguém mais se lembrava. Apenas se dizia que já era tarde. Saber de onde cada um vinha, em que ponto do globo estávamos, ou mesmo se era realmente um globo (e de qualquer forma não era um ponto), e o dia do mês de qual ano, tudo isso nos escapava. Não se levantam tais questões quando se tem sede.
Quando se tem sede, busca-se as ocasiões de beber e, quanto ao resto, apenas se finge (…) -
René Daumal – A Grande Bebedeira
1º de julho, por Murilo Cardoso de CastroNego que um pensamento claro possa ser inexprimível. No entanto, a aparência me contradiz: pois, assim como há certa intensidade de dor onde o corpo já não está envolvido, porque se dele participasse, fosse mesmo com um soluço, seria, parece, imediatamente reduzido a cinzas; assim como há um cume onde a dor voa com suas próprias asas, do mesmo modo há certa intensidade do pensamento onde as palavras já não têm parte. As palavras convêm a certa precisão do pensamento, como as lágrimas a certo (…)
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René Daumal – A Revolta
1º de julho, por Murilo Cardoso de CastroO homem que sempre aceitou tudo é como se estivesse dormindo. O sono de uma pedra não aprisiona nada; mas o sono humano não é eterno, está sempre prestes a cessar. Digo que é preciso começar por despertar absolutamente para ter direito depois ao sono da pedra, transmutado em consciência universal.
Será preciso que o homem se deslumbre com um "Não!" de fúria, e que o fogo dos "por quês?" lhe queime a garganta. Será o despertar. As escamas cairão dos olhos que verão então todas as tiranias. (…) -
René Daumal – Patafísica
1º de julho, por Murilo Cardoso de CastroFalei sobre a Visão do Absurdo na descoberta de si mesmo. Mas ela deve iluminar todas as representações de sua cruel evidência, e se tornar assim um momento do conhecimento do mundo.
Dou de bom grado a este momento da ciência o nome de "Patafísica", porque me parece reconhecer a mesma atitude de pensamento no livro de Alfred Jarry Gestos e Opiniões do Dr. Faustroll, Patafísico. Alguns franceses riram ao ler esse livro. Mas bem raros os que entenderam a verdadeira natureza do humor de (…) -
René Daumal – A Visão do Absurdo
1º de julho, por Murilo Cardoso de CastroDescreverei sucessivamente a Evidência Absurda da intuição de si pela Revelação do Riso; a Evidência Absurda da percepção do mundo pela Patafísica; e a Evidência Absurda no comportamento do homem, como princípio da Revolta.
Poderei então propor a Visão do Absurdo como tipo da primeira experiência metafísica.
A REVELAÇÃO DO RISO
Haverá para cada homem a revelação do Riso, mas que não se busque nela a alegria. No ponto em que estou, as envolturas do mundo se viram como dedos de luva: o (…)