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Huxley – Ponto de vista hebraico em relação à alma
quarta-feira 2 de abril de 2025
Aldous Huxley
Huxley
Huxley, Aldous (1894-1963)
. A Situação Humana
Vale a pena perder um momento comentando o ponto de vista hebraico em relação à alma.
Nas primeiras partes do Velho Testamento não existe alma imortal. O homem é recompensado nesta terra, e a alma e o corpo estão completamente unidos. A personalidade é mente-corpo, e, exatamente como Homero não tem palavra para a alma substancial, o hebraico do Velho Testamento não tem palavra para a concepção geral de corpo. Parece tão óbvio que os dois estão juntos que não é preciso fazer a distinção. Por outro lado, houve numerosas palavras para os vários órgãos do corpo, e no Velho Testamento, bem como no Novo, vemos que idéias psicológicas são constantemente expressas em termos fisiológicos. As entranhas de José "anelavam por seu irmão" (Gênese 43:30) e a misericórdia de Deus é equiparada a entranhas por Isaías. São Paulo exorta os colos-senses a terem "entranhas misericordiosas, bondosas, humildade de pensamento, brandura e resignação ao sofrimento" (Colossenses 3:12). Nos Filipenses ele exorta seus correspondentes pelas entranhas de Cristo (1:8), e fala nas "entranhas de misericórdias" (2:1). Nos Salmos vemos constantes referências aos rins, que têm um profundo significado psicológico. Deus "experimenta o coração e os rins" (Salmos 7:9) e testa a fé do homem: "meus rins também me instruem" (Salmos 16:7); "Examina-me, Senhor, e prova-me; experimenta meus rins e meu coração" (Salmos 26:2); "Assim meu coração ficou cheio de dor e meus rins estavam aflitos" (Salmos 73:21), e assim por diante.
Essa referência constante às expressões físicas da personalidade e condições de comportamento perpassa o Velho Testamento da maneira mais realista. Há uma espécie de proto-empirismo que, como em Homero, acentua a grande importância do lado fisiológico do homem. E, com a moderna evolução da endocrinologia, entendemos hoje que essas coisas são perfeitamente verdadeiras. Os rins, ou melhor, a adrenalina, hormônio segregado pelas glândulas situadas acima deles, são de enorme importância para nós. Ter mais ou menos adrenalina, ou nenhuma adrenalina no sangue, faz uma profunda diferença para a personalidade. Descobrimos que muitas experiências súbitas e violentas, que nos parecem totalmente irracionais, e que experimentamos, como se fossem intervenções externas, na verdade devem-se a súbitas intensificações fisiológicas de materiais químicos criados no corpo.

