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Dauge (Virgile) – reconstituição das elites
domingo 29 de junho de 2025
É assim que as elites degeneram e se suicidam.
Mas, em momentos cruciais da história, sob o impulso dos “deuses” e dos “heróis”, elas se reconstituem. No final do ciclo involutivo aparece a “raça de diamante” que sobe a corrente da degradação para se libertar — o que nos permite completar o quadro precedente (p. 12) da seguinte maneira:
5. DIAMANTE. Dominante: Júpiter.
Reprise do contato com a Fonte divina; interiorização progressiva desta Fonte, no coração da nova raça.
Elite de heróis, de sábios, de Filhos de Deus. Reino do Olimpo.
Ver a virtus Deificatio.
Tipos: Hércules, Eneias.
Eneias, de fato, representando esta raça de DIAMANTE, superará o FERRO (cf. VIII, 364: Aude contemnere opes), o BRONZE (cf. VIII, 621: fatiferum ensem; 704-5), a PRATA (cf. VIII, 533: Ego poscor Olympo; 615-6: contato pessoal com a Fonte divina, e arma radiantia. Vitória sobre Juno: I, 281; VIII, 59-61, etc.), refundirá um novo OURO (cf. VI, 851-2: regere imperio populos, pacique imponere morem), e sairá do determinismo cíclico pela deificação (cf. VIII, 364-5; XII, 167; 794-5: tema da heliomorfose).
Para que se forme e que se imponha uma nova minoria criativa, as “elites” precedentes devem, em grande parte, desaparecer. No poema virgiliano, a morte de Príamo, de Rifeu, de Creúsa, de Palinuro, de Miseno, de Niso e de Euríalo, de Palante, de Amata, de Turno, e de tantos troianos e italianos — encarnando as antigas mentalidades, as estruturas de outrora, o apego a um mundo passado — é necessária ao nascimento de algo mais importante que Troia e que a Itália original. Subsiste apenas um “pequeno resto” (cf. III, 87), em quem sobrevive a verdadeira Troia (cf. II, 241: diuom domus Ilium) — imortal enquanto “forma” do Espírito divino (cf. VIII, 37) —, mas vivificada por uma inspiração e um dinamismo novos. São eles que, detentores do fogo eterno de Vesta — simbolizando a potência soberana da Tradição, a luz do Sol supremo, e a capacidade indefinida de ressurreição —, são destinados a instaurar um novo ciclo e a fundar um novo centro espiritual (cf. I, 206; III, 462, etc.).
Para que este princípio-germe de grandeza se atualize, dois fatores devem intervir: o impulso criativo e o desenraizamento. Estes são, na Eneida Eneida , temas fundamentais. O imperativo transmutador se desdobra como um motivo musical incessantemente retomado, através das interpelações divinas, dos sinais celestes (cf. o meteoro de II, 692 sq.), dos prodígios, das tentações e das conversões humanas, dos sonhos, das provas, dos encontros. Preciso e fulgurante como a flecha de Aceste (V, 525 sq.) — que figura aliás o sucesso da teurgia do fogo —, irresistível e paciente como a ação de Vênus, este imperativo visa a junção do aqui-em-baixo e do além, à transfiguração do real, ao retorno entre os homens da presença divina (Pax = Schekhinah). Quanto ao desenraizamento, de tipo quase abraâmico, ele se traduz principalmente por uma série de partidas que são outros tantos despertares, e nesta “ascese do mar” imposta a Eneias por Júpiter como a prova libertadora por excelência (IV, 237: Nauiget!). Mas, fato capital, este desenraizamento, esta passagem através do fogo, das tempestades, dos “infernos”, das guerras, é no fundo um novo enraizamento no céu e na terra, segundo o belo verso I, 380 (Italiam quaero patriam et genus ab Iove summo), ou seja, a chave de uma nova manifestação de uma herança ancestral, de uma reconstituição, sobre melhores bases, de uma muito antiga elite com vocação universal.


Yves Albert Dauge. Virgile. Maître de Sagesse. Essai d’ésotérisme comparé. Milano: Archè, 1983