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Van Gennep (FL:C2) – As diferentes categorias de narrativas.

quinta-feira 26 de junho de 2025

Capítulo II. — As diferentes categorias de narrativas.

Definições correntes de fábula, conto, lenda e mito. — Crítica dessas definições. — As lendas totêmicas e os contos de animais. — As definições adotadas.

Poder-se-ia, portanto, distinguir duas classes de narrativas: aquelas que têm um valor estético e aquelas que têm, antes de tudo, um valor utilitário. Mas as narrativas também podem ser classificadas de acordo com seu conteúdo, ou seja, de acordo com os temas, as crenças e a natureza dos personagens.

Eis as distinções comumente traçadas entre as diversas categorias de narrativas sob esse ponto de vista.

Por fábula, entende-se uma narrativa em verso com personagens animais dotados de qualidades humanas ou que agem como se fossem homens. Em prosa, essa narrativa é chamada de conto de animais.

O conto seria uma narrativa maravilhosa e romanesca, cujo local da ação não é especificado, cujos personagens não são individualizados, que corresponderia a uma concepção "infantil" do universo e que seria de uma "indiferença moral" absoluta. Como dizem os Gesta Romanorum: "Erat quidam rex in cujus imperio quidam pauper habitabat..." Ou ainda: Em um reino da China, vivia um príncipe belo como o dia...

Na lenda, o local é indicado com precisão, os personagens são indivíduos determinados, seus atos têm um fundamento que parece histórico e são de natureza heroica.

Finalmente, o mito seria, em suma, uma lenda situada em regiões e tempos fora do alcance humano e com personagens divinos.

Mas essas são definições que datam de um período em que o conhecimento aprofundado das literaturas orais do mundo todo mal começava. Não apenas se mostraram na prática demasiado estreitas, mas, de fato, na imensa maioria dos casos, é impossível discernir a qual dessas categorias uma narrativa determinada pertence exatamente.

Assim, entre as populações no estágio do totemismo, circulam narrativas com personagens animais. Mas esses animais são totens, ou seja, os ancestrais e parentes dos grupos humanos. "No princípio", diz uma narrativa australiana (tribo Dieri), "a terra se abriu no meio do lago Perigundi, e dela saiu um totem após o outro: o corvo, o papagaio, o emu e assim por diante. Como ainda estavam incompletamente formados e sem membros nem órgãos dos sentidos, deitaram-se nas dunas. Estendidos ao sol, sua força aumentou, e seu vigor, de modo que finalmente se levantaram como homens e se dirigiram para todas as direções."

Vê-se claramente que o totem é um ser ao mesmo tempo animal e humano, concepção que se encontra nas fábulas de Esopo e mesmo nas de La Fontaine. Pois ambos deixam entender que, se os animais podem se comportar de maneira humana, os homens também podem se comportar de maneira animal, mas isso no domínio moral e físico.

Ora, o estágio intermediário entre a lenda australiana e a fábula europeia constitui uma vasta categoria de narrativas que se encontram quase por toda parte, as mais conhecidas sendo as da África.

O elefante, rei dos animais, convocou um dia todos os seus súditos sob pena de morte. Todos atenderam ao chamado, exceto o caracol. O palácio se reuniu sob a presidência do elefante-rei e estava chegando ao fim quando os animais começaram a gritar: "o caracol, eis o caracol!" e o viram se aproximar todo trêmulo. "De onde vens?", gritou o elefante. "Da minha aldeia." "E por que tão tarde? Não recebeste meu mensageiro?" "Recebi, ó pai elefante, e parti imediatamente. Mas me deste apenas um pé para caminhar, os galhos me cegavam, e temo o frio e a chuva. Por isso voltei para casa e decidi levar minha casa nas costas." O elefante-rei riu muito e por muito tempo desse discurso. Depois: "Falaste bem, pai caracol. Doravante terás os olhos na ponta de chifres e poderás recolhê-los, assim os galhos não poderão mais te atingir. Mas, para te punir por ter faltado ao palácio, carregarás sempre tua casa nas costas." E assim ele fez desde então. Afinal, acrescentam os Pahouins, de quem este é um relato favorito, não é um grande castigo: dessa forma o caracol não precisa trabalhar para construir uma casa.

O fato notável é que a maioria dos animais que desempenham um papel nessas narrativas também o desempenham nas narrativas sobre a formação e organização do mundo e das sociedades e, portanto, são então heróis civilizadores e quase divindades.

Essa mistura, tanto mais impressionante quanto se trata de populações mais rústicas, tem para nós o significado de que a fábula, em sua forma moderna, é um ponto extremo de toda uma categoria de narrativas que tem, como outra forma extrema, a lenda totêmica. Ter-se-á notado que a narrativa australiana citada é localizada e precisa: fala-se de um certo lago, e os totens são apenas os que constituem a tribo Dieri da Austrália central. Assim, a fábula está diretamente ligada ao que se chama de lenda, e, exceto nos casos extremos, uma distinção rigorosa aqui é impossível.

Chega-se ao mesmo resultado ao estudar os contos maravilhosos. A história do elefante e do caracol é, em certo sentido, um conto, pois é irreal para nós e divertida; os personagens são um elefante e um caracol quaisquer, e o local do palácio não é indicado. Os Contos de Perrault correspondem à definição corrente: mas há variantes orientais que são localizadas e individualizadas e que são, portanto, lendas.

A dificuldade é ainda maior para distinguir o mito da lenda. Uma narrativa com personagens divinos pode não ser localizada, a ação pode se desenrolar em qualquer lugar. Por outro lado, muitas vezes é difícil determinar a verdadeira natureza do herói. Assim, os historiadores das religiões contestam a certos personagens sobrenaturais australianos ou americanos a qualidade de deuses, a ponto de, recentemente, um termo menos preciso tender a se impor, o de All-Fathers, Pais-de-todos-e-de-tudo.

Outro termo vago, o de herói civilizador. Em que momento Hércules pode ser qualificado, ou foi qualificado, como deus? E todas as categorias de demônios! Em suma, considerando apenas a natureza dos personagens, não se consegue estabelecer critérios precisos de diferenciação entre lenda e mito.

Se, por outro lado, adotarmos a definição preferida na Alemanha, segundo a qual só são mitos as narrativas que se referem a fenômenos naturais (céu, trovão, astros), deparamo-nos com uma nova dificuldade. Esses fenômenos naturais são às vezes considerados como tais, às vezes personificados, e não se vê por que uma narrativa seria qualificada de mito quando o personagem é, por exemplo, o próprio Céu, e de lenda se é um Deus-Céu. O mesmo para o Trovão e os Deuses-Trovão. Na maioria dos casos, é quase impossível discernir se a narrativa trata de um fenômeno natural ou da divindade que se identifica com ele.

Diante dessas dificuldades, tentou-se estabelecer as definições com base em outros critérios que não o conteúdo dos temas. Inútil discutir a tentativa baseada na distinção entre "criação individual" e "criação coletiva". Em alguns casos, sem dúvida, pode-se surpreender um ou outro modo de criação no momento mesmo de sua atividade.

Mas quando se trata de temas que já têm certa idade, não se sabe mais a que se apegar, assim como não se pode, ao ver uma máquina de imprimir moderna, reconhecer o autor de cada um dos aperfeiçoamentos de detalhe pela acumulação dos quais ela chegou à sua constituição atual. Mesmo com a escrita, os arquivos, os jornais, as revistas, também não conseguiríamos nomear os inventores reais da bicicleta, do automóvel, da locomotiva. Em desespero de causa, escolhe-se um dos nomes que se apresentam e cria-se assim um inventor único reverenciado por crianças e multidões, por um processo de simplificação inexata que é o mesmo que presidiu outrora à criação dos heróis civilizadores lendários.

Vem, por fim, a distinção psicológica. São então lendas e mitos as narrativas que são objeto de crença; são contos, fábulas, etc., as que não são objeto de crença. E com um grau a mais de precisão: são mitos as narrativas objeto de crença que se traduzem em atos mágicos e religiosos.

Em teoria, essas definições são excelentes, porque existe de fato uma linha de demarcação muito nítida, absoluta, entre o profano e o sagrado. A dificuldade consiste apenas em discernir quando e onde uma mesma narrativa ou tema é, ou não, "objeto de crença". A criança acredita na existência do Pequeno Polegar ou da Cinderela? Onde se colocarão os "contos maravilhosos", cujos personagens são fadas, ogros, onde se fala de objetos mágicos, de metamorfoses? Não seriam lendas, ainda que não localizadas e com personagens não individualizados?

Por outro lado, certas narrativas com personagens claramente divinos não se traduzem em atos, e, se se trata de narrativas clássicas, nada prova que em determinado momento tenham feito parte, como elementos essenciais, das cerimônias religiosas. Por outro lado, a recitação dos poemas homéricos fazia parte de cerimônias desse tipo, e o caráter sagrado de sua recitação é provado pelas invocações que as precediam, os "hinos homéricos".

Todas as definições propostas são, portanto, ao mesmo tempo exatas e inexatas: cada uma delas abrange um grupo mais ou menos considerável de fatos, sem levar em conta os casos intermediários, que não são negligenciáveis nem por seu número nem por sua difusão.

Não há nisso nada de vergonhoso para a ciência, nem, espero, de desagradável para o leitor. O que surpreenderia é que qualquer atividade humana pudesse ser definida por fórmulas rígidas e estreitas. Toda atividade, a produção literária como as outras, está sujeita ao jogo livre das forças, jogo ilógico e irracional com o qual o homem se acomoda como pode.

Seja como for, os termos em questão serão aqui empregados, em primeiro lugar, com seu sentido ordinário e com seu sentido científico recente, cabendo precisar mais à medida que surgirem casos particulares. Ou seja, entender-se-á por lenda uma narrativa localizada, individualizada e objeto de crença, e por mito uma lenda em relação com o mundo sobrenatural e que se traduz em atos por meio de ritos.