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Jean Richer – Carta de Jacques Cazotte
domingo 6 de julho de 2025
[sobre a vaidade da polêmica e da poesia [1]]
Paris, 17 de julho de 1779.Tendes-me, senhor, infinitamente lisonjeado pela confiança com que me honrastes e vou esforçar-me para me mostrar digno dela. É preciso, antes de tudo, que confesse que, ao ouvir a leitura de vossa carta e no primeiro impulso, minha frágil prudência não me sugeriu o melhor conselho que deveria dar. Reli essa carta e, no silêncio de meu gabinete, nada imaginei que a tornasse digna de vós. Então, examinei seriamente se era indispensável que escrevêsseis. Eis o resultado de minhas reflexões.Em geral, defender-se assim de uma calúnia feita para cair por si mesma é dar-lhe publicidade que não tem e importância que nunca terá. Nada é tão desprezado nem tão desprezível, tão repleto de falsidades quanto o obscuro compêndio no qual foi enterrada. As pessoas honradas sabem disso. Por que fazê-la viver, em extratos, no Journal de Paris, que está sobre a lareira de todas as pessoas honradas, e ensinar-lhes que fostes caluniado? Ninguém crerá que sois o autor da sátira pela acusação de um escritor desse tipo; mas se confessardes, como é verdade, que favorecestes sua venda, isso só pode desagradar formalmente ao Sr. [Clément] [2], cujo caráter privado estimais e cujo estado honrais. Deixaria, portanto, que se acreditasse que tudo é falso e tende certeza de que assim se crerá.Não sois o único falsamente caluniado nessa diatribe e seríeis o único que lhe teria feito a honra de se ofender. Apostaria que são poetas que vos deram, sobre esse assunto, o excesso de humor que tendes. É uma raça irritadiça que vive de orgulho. Concordastes comigo, senhor, que não os amais, que os vede pouco; eles são, senhor, mais para fugir do que nunca. Como, graças a tudo o que se passa e passou, o estado de autor caiu em um descrédito do qual os séculos passados não fornecem exemplo, é preciso ser furiosamente levado por seu gênio ou muito desviado por seu gosto para afetar um título que afasta quem o ostenta da consideração e dos empregos. Citarei apenas uma prova do que afirmo. Um abade de meu conhecimento, homem de muito mérito, tem direito, por serviços reais, a solicitar um benefício.O ministro encarregado da folha não sabe como fazer para recompensá-lo porque é conhecido como homem de letras e que... permiti que não diga mais.Desde minhas loucuras, feitas aos dezenove anos, passei vinte anos a serviço do Rei sem deixar supor que soubesse versificar, e não pareceria bom para nada se me julgassem capaz disso. Se tivesse adivinhado o rumo que as coisas tomariam, talvez não tivesse impresso nada. Segundo essa forma de pensar, julgai, senhor, se não considero uma espécie de imprudência entregar-se publicamente ao gosto da poesia, seja para se destacar da multidão, seja para pretender sair dela.Volto à minha tese. É preciso ser um Corneille ou faltar com reflexão para decididamente tornar-se autor, hoje.Deus não permita, senhor, que eu renuncie à satisfação de cultivar as letras e que me censure por tê-las cultivado. Os trabalhos que fiz nesse gênero facilitaram-me todos os que me restam fazer, todos aqueles de que fui encarregado. Nunca dei importância suficiente à glória vã que me poderia advir para ficar mortificado ao ver o preconceito atual me privar de seu gozo. Divertí-vos, senhor, fareis bem; escondei-vos para fazê-lo, fareis melhor.Guardo vossa carta e a levarei quando for jantar com o senhor vosso pai. Se quiserdes imprimi-la, corrigi-la-emos juntos, sob a condição de que ele consinta; pois não deveis imprimir nada publicamente sem sua aprovação. Buscais exemplos de piedade filial. Depende apenas de vós dar um, para vossa própria edificação, seguindo os conselhos de vossos respeitáveis pais; os sentimentos virtuosos que me mostrastes são, em tudo, análogos à deferência que lhes deveis. Perdoai minha longa carta, ela terminará por falta de papel. É com pesar da minha parte, crede no interesse que me inspirastes, assim como tantos outros sentimentos com os quais vos asseguro de todo o coração, senhor, vosso muito humilde e muito obediente servidor.
Notar-se-á que a condenação que Cazotte Cazotte Jacques Cazotte (1719-1792) faz dos escritos literários concerne apenas à poesia. Foi em 1772, portanto sete anos antes, que ele publicou Le Diable amoureux.
Os trabalhos "que lhe restam fazer" e aqueles "de que foi encarregado" concernem talvez às suas ocupações administrativas, mas uma alusão tão geral permite perguntar se Cazotte Cazotte Jacques Cazotte (1719-1792) não pensa também em seus trabalhos iniciáticos; nessa data, isso não seria surpreendente.


RICHER, Jean. Aspects ésotériques de l’œuvre littéraire: Saint Paul, Jonathan Swift, Jacques Cazotte, Ludwig Tieck, Victor Hugo, Charles Baudelaire, Rudyard Kipling, O.V. de L. Milosz, Guillaume Apollinaire, André Breton. Paris: Dervy-livres, 1980.