(Lispector1973)
Mas sou o quê? a resposta é apenas: sou o quê. Embora às vezes grite: não quero mais ser eu!! mas eu me grudo a mim e inextrincavelmente forma-se uma tessitura de vida.
Quem me acompanha que me acompanhe: a caminhada é longa, é sofrida mas é vivida.
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Lispector
Lispector, Clarice (1920-1977)
Matérias
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Lispector – Sou o quê
28 de março, por Murilo Cardoso de Castro -
Clarice Lispector (Crônicas): Dies Irae
23 de julho de 2024, por Murilo Cardoso de CastroEu não sabia que só o meio-termo não é pecado mortal. Eu tinha vergonha do meio-termo. Os pecados são mortais não porque Deus mata, mas porque eu morro deles. Eu é que não pude arcar com os pecados mortais. O que não consegui com eles é isto o que hoje me violenta e a que respondo com violência. Os meus pobres meios canhestros não me conseguiram nem terra nem céu e a fúria me toma. Ah mas se por um instante eu entender que a fúria é contra os meus erros e não contra os dos outros – então (…)
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Lispector – Eu é
28 de março, por Murilo Cardoso de Castro(Lispector1973)
Estou de olhos fechados. Sou pura inconsciência. Já cortaram o cordão umbilical: estou solta no universo. Não penso mas sinto o it. Com olhos fechados procuro cegamente o peito: quero leite grosso. Ninguém me ensinou a querer. Mas eu já quero. Fico deitada com olhos abertos a ver o teto. Por dentro é a obscuridade. Um eu que pulsa já se forma. Há girassóis. Há trigo alto. Eu é. -
Lispector – O instante é de um escuro total
28 de março, por Murilo Cardoso de Castro(Lispector1973)
Espere: está ficando escuro. Mais. Mais escuro. O instante é de um escuro total. Continua.
Espere: começo a vislumbrar uma coisa. Uma forma luminescente. Barriga leitosa com umbigo? Espere – pois sairei desta escuridão onde tenho medo, escuridão e êxtase. [...]
Agora as trevas vão se dissipando.
Nasci.
Pausa. Maravilhoso escândalo: nasço. -
Lispector – Quero captar o meu é
28 de março, por Murilo Cardoso de Castro(Lispector1973)
Só no ato do amor – pela límpida abstração de estrela do que se sente – capta-se a incógnita do instante que é duramente cristalina e vibrante no ar e a vida é esse instante incontável, maior que o acontecimento em si. [...] E no instante está o é dele mesmo. Quero captar o meu é. E canto aleluia para o ar assim como faz o pássaro. E meu canto é de ninguém. Mas não há paixão sofrida em dor e amor a que não se siga uma aleluia. -
Lispector – Instante-já
28 de março, por Murilo Cardoso de Castro(Lispector1973)
Eu te digo: estou tentando captar a quarta dimensão do instante-já que de tão fugidio não é mais porque agora tornou-se um novo instante-já que também não é mais. Cada coisa tem um instante em que ela é. Quero apossar-me do é da coisa. [...] Quero possuir os átomos do tempo. E quero capturar o presente que pela sua própria natureza me é interdito: o presente me foge, a atualidade me escapa, a atualidade sou eu sempre no já. -
Lispector – Simetria
28 de março, por Murilo Cardoso de Castro(Lispector1973)
Perdi o medo da simetria, depois da desordem da inspiração. É preciso experiência ou coragem para revalorizar a simetria, quando facilmente se pode imitar o falso assimétrico, uma das originalidades mais comuns. Minha simetria nos portais da igreja é concentrada, conseguida, mas não dogmática. É perpassada pela esperança de que duas assimetrias encontrar-se-ão na simetria. Esta como solução terceira: a síntese. -
Lispector – O próximo instante é feito por mim?
28 de março, por Murilo Cardoso de Castro(Lispector1973)
É com uma alegria tão profunda. É uma tal aleluia. Aleluia, grito eu, aleluia que se funde com o mais escuro uivo humano da dor de separação mas é grito de felicidade diabólica. Porque ninguém me prende mais. Continuo com capacidade de raciocínio – já estudei matemática que é a loucura do raciocínio – mas agora quero o plasma – quero me alimentar diretamente da placenta. Tenho um pouco de medo: medo ainda de me entregar pois o próximo instante é o desconhecido. O próximo (…) -
Lispector (PSGH): Deus
23 de julho de 2024, por Murilo Cardoso de CastroQuanto mais precisarmos, mais Deus existe. Quanto mais pudermos, mais Deus teremos. Ele deixa. Ele não nasceu para nós, nem nós nascemos para Ele; nós e Ele somos ao mesmo tempo.
Ele está ininterruptamente ocupado em ser, assim como todas as coisas estão sendo, mas Ele não impede que a gente se junte a Ele e, com Ele, fique ocupado em ser, numa intertroca tão fluida e constante - como a de viver. Ele, por exemplo, Ele nos usa totalmente porque não há nada em cada um de nós de que Ele, cuja (…) -
Lispector (HE): acontecer antes de acontecer
23 de julho de 2024, por Murilo Cardoso de CastroTudo no mundo começou com um sim. Uma molécula disse sim a outra molécula e nasceu a vida. Mas antes da pré-história havia a pré-história da pré-história e havia o nunca e havia o sim. Sempre houve. Não sei o quê, mas sei que o universo jamais começou.
Que ninguém se engane, só consigo a simplicidade através de muito trabalho.
Enquanto eu tiver perguntas e não houver resposta continuarei a escrever. Como começar pelo início, se as coisas acontecem antes de acontecer? Se antes da (…)